Gloria Groove celebra mais um desafio à frente do ‘Música Boa ao Vivo’: ‘Momento de glórias’
Por Flavia Cirino - 13/09/22 às 14:30
Foi logo ali, em 2014, que Daniel Garcia passou a se identificar com a cultura drag queen. E isso aconteceu ao assistir o talent show “RuPaul’s Drag Race”. Na atração, artistas performáticos competiam para permanecer no programa através de números interpretativos de música e dança. Foi a partir dali que o rapaz, disposto a se redescobrir, criou a persona Gloria Groove.
“Sempre fiz metáforas exageras e gigantes na minha mente Transformo isso numa arte maluca. Cada artista tem seu jeito particular de transmitir e a Gloria Groove foi o jeito que encontrei, muito cedo, por sinal, com 18 anos, de dizer o que estava na minha cabeça e, finalmente me sentir pertencente a algo maior do que eu”, disse o artista à reportagem de OFuxico.
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Sem a caracterização da drag queen, Daniel Garcia, de 27 anos, bateu um papo aberto e empolgado sobre seu atual e promissor momento. Na noite desta terça-feira, 13 de setembro, ele – na pele de Gloria Groove – estreia como apresentador do programa “Música Boa ao Vivo”, que chega à oitava edição como uma das pratas do Multishow.
Na atração, já comandada por Ivete Sangalo, Iza, Thiaguinho, Anitta e outros, Gloria desponta como a primeira drag na função, com a missão de reunir os principais nomes da música brasileira e gerar encontros inusitados em uma mistura de ritmos inédita.
“Só de estar aqui já é a materialização de algo que eu acreditava estar muito mais distante. Me sinto muito lisonjeado de terem confiado à mim essa função”, disse o artista.
Na véspera da estreia, Daniel recebeu a reportagem de OFuxico no estúdio da atração, “desmontado” e cheio de empolgação pelo debut, que terá no palco Jão, Xamã e Marina Sena como convidados.
Serão 15 episódios, sempre às terças-feiras, às 20h. Além do programa, Gloria Groove terá, no mês de outubro, o desafio de apresentar pela primeira vez a 29ª edição do Prêmio Multishow, ao lado de Linn da Quebrada e Marcos Mion.
Para o artista, que começou a cantar aos 4 anos, é mais do que uma realização: “O menino que via e admirava Ru Paul de drag queen, agora está aqui”, disse Daniel, emocionado.
Confira a entrevista a seguir:
OFuxico: O que você traz de memória afetiva, desde quando era criança e admirada as apresentadoras de TV, que pretende trazer pra esse momento do ‘Música boa ao Vivo’?
Gloria Groove: Quando penso em programa de TV, em alguém cantando e apresentando, minha cabeça vai diretamente pra Xuxa e Eliana, que participaram muito da minha construção. Eu era muito aficionado pelas músicas e Cds da Eliana. Sabia todas, fazia parte do meu desenvolvimento e tive a chance de estar com ela várias vezes por conta do ‘Balão mágico’ (grupo infantil do qual ele fazia parte). E claro todas as referências que tive na minha pré-adolescência, com RBD, ‘High School Musical’, o que não faltou pra mim foram referências de pessoas jovens no comando de alguma coisa. M
OFuxico: Te assusta chegar nesse momento tão importante, de ser apresentador de um programa tão importante para o Multishow?
Gloria Groove: Quando eu via a Ru Paul em Nova Iorque, quando ela tinha 20 e poucos anos e o que era depois, quando ela levou pra TV e como moldou isso com o tempo são coisas muito diferentes, coisas muito distintas. Eu venho tentando entender o quanto da minha própria identidade artística vai chegar nessa Gloria apresentadora e o quanto de coisas novas vão chegar, o quanto que desse novo comportamento. Tenho que ser 100% eu e ao mesmo tempo ser 100% o que o programa sempre foi porque sempre tive essa vontade de incorporar o próprio espírito do programa, que tem uma vibe específica.
OFuxico: Você apresentou o TVZ, então já era meio que uma preparação…
Gloria Groove: Desde o TVZ eu venho estudando que apresentadora seria essa Gloria que se comunica, que fala com o público, e no TVZ tive essa chance de exercitar isso bastante. Foi muito gostoso, mas agora vou expandir isso. É um show, um mini-festival por semana, de 2h. Claro que a isso adiciona várias camadas, mas estou muito pronto. Das últimas vezes que vi uma pessoa comandando fiquei observando e disse: ‘deve ser uito louco fazer todo esse malabarismo, mas deve ser legal’.
OFuxico: O que você apontaria como maior característica de seu comando no “Música Boa ao Vivo’?
Gloria Groove: Diversidade. Sinto que vai ser a chave dessa temporada de glórias é mostrar que no Brasil a gente faz de tudo. O meu próprio trabalho é algo que já passa essa mensagem, já mostra o que é possível, o que é possível fazer no nosso país com as ferramentas e as referências que a gente tem. Sinto que meu trabalho é um forte representante disso e acho que os convidados vão ter que dar esse tom. É assim que traremos um pouco de tudo em uma temporada de glórias. Confesso que a minha vontade é aprender com essas pessoas que vão passar por aqui. Vou conhecer pessoas no palco, assim como é incrível receber amigos de longa data, com quem você já tem familiaridade como vou fazer logo de cara com os três amores da minha vida que serão os primeiros convidados.
OFuxico: Você é a primeira drag comandando o programa. Pesa essa representatividade LGBTQIAP+?
Gloria Groove: São muitas primeiras vezes marcantes… acabei de ser a primeira drag num show solo num line-up de um festival como o Rock in Rio. Agora, a primeira vez de uma drag queen num programa dessa importância, que tem uma continuidade, um formato que a gente já conhece. Quem ainda não conhece o meu trabalho e a minha personalidade, já sabe o que é o ‘Música Boa’ e vai ter esse processo de entender que eu sou e como estou fazendo. É isso que gera essa ansiedade boa de pensar qual a expectativa que a gente tem de furar o teto, de exceder. Mas acredito que passa uma mensagem muito importante. O canal mostra um posicionamento fortíssimo de mostrar cimo as pessoas LGBTQIAP+ são capazes de estar em posições que a gente nunca imaginou. Na maioria das vezes há falta de oportunidade desses espaços abertos para que a pessoa mostre seu trabalho. Eu tive o privilégio de construir uma carreira que não começou só na Gloria Groove. Sou artista desde criança, então acredito que o ‘Música Boa’ nessa fase da minha vida vem como uma confirmação e o resultado de uma vida toda dedicada à arte.
OFuxico: Você tem a noção dessa responsabilidade?
Gloria Groove: Eu tenho noção do quanto ocupando esse espaço eu faço refletir em vidas ao meu redor. Acabo sendo um espelho, sendo um exemplo de que é possível sim. Por que não uma drag queen não poderia apresentar um programa de música, um programa que tem esse nível de importância, respeito e credibilidade pra nossa cultura. É muito forte, representa coisas muito fortes, é muito plural. Eu acabo criando uma nova realidade que a gente não sabia que era possível.
Quando eu faço uma coisa pela primeira vez, estou trazendo todo mundo junto comigo. Nunca faço nada só por minha causa”.
OFuxico: Sua carreira sempre foi moldada por versatilidade entre gêneros musicais. Algum deles ainda te deixa apreensiva?
Gloria Groove: Fico me cobrando a vida inteira e agora abri uma pesquisa de fato, é o samba. Sempre me questionei: se u dia eu cair numa roda de samba, o que vou cantar? Imagina! Uma cobrança que fica no meu subconsciente, um repertório de uns cinco sambas. Das coisas que lembro de ter tirado em repertório de banda de baile, o samba nunca ficava comigo. Me entregavam os boleros, as músicas atuais, os pop românticos que conhecia por causa da minha mãe… a gente fica reparando no que falta e isso quero aproveitar pra aprender com os melhores, porque na minha vida, hoje, tenho gênios do samba a um telefonema de distância, é surreal. Uma vivência artística muito privilegiada saber que posso aprender direto da fonte, com as pessoas mais incríveis. E o ‘Música Boa’ vai ser isso, vou ter que me preparar pra cantar com essas pessoas.
OFuxico: Você consegue lidar com leveza…
Gloria Groove: Tudo pra mim acaba sendo uma grande brincadeira como quando topei cantar Bruno e Marrone com a Simone e Simaria no ‘Música Boa” da Iza. Pra mim era uma grande brincadeira de karaokê, uma vivência grande na minha família. A minha tia Soraia foi gerente de karaokê por muitos anos e eu ia com ela. Comia uma batatinha, cantava uma música. O lazer da minha família era esse. Então, o karaokê da mia tia, a banda de baile, quando eu tinha que substituir o cantor quando ele faltava, essa vivência que me traz a segurança de que consigo executar o ‘Música Boa’, mesmo que caia na minha mão um estilo que eu não tenha tamanha tanta familiaridade.
OFuxico: Quais seriam, então, os elementos para ter, de fato, uma música boa, parafraseando o nome do programa, trazendo toda a sua bagagem desde a infância?
Gloria Groove: O conceito está muito aberto ao conceito de cada u. O que soa bem pra Gloria Groove é uma música que tenha um tema legal, Adoro temas interessantes, uma letra que tenha objetos que fujam do comum, que não rime substantivo com substantivo. Gosto muito de títulos impactantes. Geralmente a composição pra mim acontece a partir de um título, de um refrão que ficou na minha cabeça ou um tema que gostaria de abordar. No karaokê, por exemplo, que faz uma boa música é o fator surpresa, a dinâmica, mostra várias nuances num tempo de 3 minutos. Gosto de brincar cm dinâmica, faz a emoção acontecer.
OFuxico: Looks, coreografias, o que podemos esperar?
Gloria Groove: A primeira coisa que pensei: tenho que entender quais os dias que vou dançar, que dia posso ir de vestido curto, que dia posso ir de telinha, quando terei que usar calça legging, uma coisa mais justa, de botinha, pra poder quebrar e dançar. E quais os dias que terei que fazer a bonita, andando pra lá e pra cá com minha boa ficha. Tenho tanta coisas para me preocupar, mas tenho tanta gente competente à minha volta que aí que entra a preocupação da drag queen, com os detalhes. Tenho uma equipe atenta pra garantir a cola se a minha unha pular. Como já trago isso na minha vivencia de clipes e shows, fico mais preocupada em como vou e colocar, o quanto posso me jogar, quem sou eu neste dia.
OFuxico: Em algum dia você pretende se apresentar como Daniel?
Gloria Groove: Quando entro nesse momento da performance, me agarro muito na imagem da Gloria. Não é uma questão tão prática e profissional pra mim, pessoalmente. A Gloria Groove é uma armadura mesmo. É importante mencionar para as pessoas entenderem a insegurança. Apesar de eu me apresentar como criador nessa ou aquela situação, a gloria Groove tem um peso gigante pra mim ainda. Pra eu sentir que estou aramado mesmo, de peito aberto pra encarar o que vier pela minha frente. Acho que esse é o poder que a persona drag faz entrar na sua vida, que é muito difícil de explicar. Sei que sou capaz de fazer tudo com ou sem ela, ma as chegada da Gloria Groove na minha vida representa justamente o corpo cênico que precisava pra me sentir seguro em cena, pra sentir que eu não estava nu em cena, só com a minha alma. Claro que a minha relação com isso mudou muito de lá pra cá, desde que consegui fazer com a Gloria Groove fosse algo muito maior do que somente produto da minha imaginação, fazer todo mundo dançar nessa fantasia, com essa entidade musical chamada Gloria Groove, que hoje está muito além da minha pessoa. Pra mim seria mais um entre tantos experimento artísticos entre tantos que faço. Mas tenho certeza de que vou curtir muito mais vendo a Gloria Groove, que representa a projeção, a construção. Ela é a diva que eu gostaria que existisse. Gosto da ideia de ter a Gloria Groove e não o Daniel Garcia apesentando esse programa. Tem um valor estético, político, artístico o fato de ser uma pessoa montada, uma drag queen.
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É jornalista formada pela Universidade Gama Filho e pós-graduada em Jornalismo Cultural e Assessoria de Imprensa pela Estácio de Sá. Ela é nosso braço firme no Rio de Janeiro e integra a equipe de OFuxico desde 2003. @flaviacirino