‘Capitão Gay’ foi um dos personagens mais marcantes de Jô Soares
Por Redação - 05/08/22 às 15:14
Quem viveu a década de 1980, certamente deu muitas risadas com o icónico ‘Capitão Gay’, o super-herói homossexual que usava um uniforme cor-de-rosa e andava sempre acompanhado de seu ajudante Carlos Sueli (Eliezer Motta), interpretado por Jô Soares, no programa “Viva o Gordo”, primeiro humorístico comandado exclusivamente por Jô na TV Globo.
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Em novembro de 2018, em entrevista a Pedro Bial, Jô recordou o personagem criado por Max Nunes. Jô contou por que o papel quase não foi ao ar.
“Estávamos em plena repressão, tinham personagens que era proibidos assim como Gandola, que ficou um ano e meio no ar, e aí descobriram que gandola era o nome de uma túnica usada pelo exército. E aí proibiram”, começou.
“E aí, o Borjalo [Mauro Borja Lopes], que era o diretor artístico na época, cortou, disse ‘não pode, não pode porque o governador de Brasília é o coronel gay, e isso vai dar um problema’. Então, eu fui falar com o Boni, disse a ele que assim ficaria difícil. A gente não pode falar de política, aí faz uma crítica social falando a favor do movimento gay e também não pode? Fica demais. O Boni então ligou para o Borjalo. ‘Borjalinho, ô, querido, eu vou querer ‘peitar’, pode deixar o Capitão Gay, eu me responsabilizo'”, recordou.
“E acabou que o personagem foi um sucesso. E um dia, eu estou no aeroporto e escuto alguém me chamando: ‘Jô, Jô. Sabe quem eu sou? Eu sou o coronel gay. Adoro o personagem e eu me divirto demais’. Quer dizer que você vê que as pessoas às vezes querem exercer uma censura maior que a verdade”, contou Jô.
MORTE
Morreu na madrugada desta sexta-feira, 05, aos 84 anos, de causa não divulgada, o escritor e humorista Jô Soares. O artista carioca estava internado no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo desde o último dia 28 de julho. De acordo com a TV Globo, em nota, o hospital informou que a família não autorizou a revelação da causa da morte do apresentador. Além disso, os médicos que cuidavam de Jô também não realizarão nenhuma coletiva de imprensa para falar do caso.
O anúncio da morte de Jô Soares, ocorrida às 02h30 desta sexta-feira, 05 de agosto foi feito por Flavia Pedras Soares, ex-mulher de Jô, e confirmada em nota pela assessoria de imprensa do Hospital Sírio-Libanês. Ela, que era chamada pelo artista carinhosamente de Flavinha, usou as redes sociais para lamentar a morte do apresentador. Jô estava internado no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, desde o dia 28 de julho, onde deu entrada com quadro de pneumonia.
“Faleceu há alguns minutos o ator, humorista, diretor e escritor Jô Soares. Nos deixou no hospital Sírio Libanês, em São Paulo, cercado de amor e cuidados. O funeral será apenas para família e amigos próximos”, anunciou Flavia.
“Assim, aqueles que através dos seus mais de 60 anos de carreira tenham se divertido com seus personagens, repetido seus bordões, sorrido com a inteligência afiada desse vocacionado comediante, celebrem, façam um brinde à sua vida.”
“A vida de um cara apaixonado pelo país aonde nasceu e escolheu viver, para tentar transformar, através do riso, num lugar melhor”, escreveu a ex-mulher do humorista.
Flavia ainda revelou os apelidos que chamava o ex-marido: “Viva você, meu Bitiko, Bolota, Miudeza, Bichinho, Porcaria, Gorducho. Você é orgulho pra todo mundo que compartilhou de alguma forma a vida com você”, escreveu ela.
Ela ainda agradeceu e usou bom humor: “Agradeço aos senhores Tempo e Espaço, por terem me dado a sorte de deixar nossas vidas se cruzarem. Obrigada pelas risadas de dar asma, por nossas casas do meu jeito, pelas viagens aos lugares mais chiques e mais mequetrefes, pela quantidade de filmes, que você achava uma sorte eu não lembrar pra ver de novo, e pela quantidade indecente de sorvete que a gente tomou assistindo.”
Flavia se declarou ao ex-marido. “Obrigada para sempre, pelas alegrias e também pelos sofrimentos que nos causamos. Até esses nos fizeram mais e melhores. Amor eterno, sua, Bitika.”
TRAJETÓRIA
Filho do empresário paraibano Orlando Heitor Soares e de Mercedes Leal Soares, José Eugênio Soares, mudou-se com a família aos 12 anos, para a Europa. Poliglota, chegou a pensar em seguir a carreira diplomática, mas seu fascínio pelo teatro falou mais alto, ainda nos anos em que estudava na Suíça.
Sua estreia se deu no papel de um americano em “O Homem do Sputnik”, filme de Carlos Manga estrelado por Oscarito, em 1958. No mesmo ano, escrevia para o TV Mistério, programa da TV Continental, dirigido por Adolfo Celli, com Paulo Autran e Tônia Carrero no elenco. Na TV Rio, atuou no programa “Noites cariocas”. Também nesta época fez participações na TV Tupi.
Jô Soares começou a trabalhar na TV Record, em 1961, em São Paulo. Além de escrever o “Simonetti Show”, atuava em programas como o “La Reuve Chic”, “Jô Show”, “Quadra de Azes” (ao lado de Zilda Cardoso, Darlene Everson e Cauby Peixoto), “Show do Dia 7” e “Você é o Detetive”.
Ele também interpretou o mordomo de ‘A Família Trapo”, seriado que escrevia com Carlos Alberto de Nóbrega.
ASCENSÃO NA TV GLOBO
Com Renato Cortes Real, Jô protagonizou, a partir de 1970, o “Faça Humor, Não Faça a Guerra”, programa que marcou sua estreia na Globo. A dupla também escrevia o programa, ao lado de Max Nunes, Geraldo Alves, Hugo Bidet e Haroldo Barbosa. Nele, o artista interpretou tipos como Norminha e Padre Thomas.
O “Faça Humor, Não Faça a Guerra” foi substituído por “Satiricom”, em 1973. Três anos depois, o humorista atuou como ator e redator, novamente com Max Nunes e Haroldo Barbosa em outro grande sucesso da Globo, o “Planeta dos Homens”, que ficou no ar até 1982.
Jô Soares dividia a cena com grandes nomes do humor, como Agildo Ribeiro, Paulo Silvino, Luís Delfino, Sonia Mamede, Berta Loran, Costinha, Eliezer Motta e Carlos Leite.
O comediante criou para o programa personagens como o Dr. Sardinha (inspirado no economista Delfim Netto, então ministro da Agricultura); Sebá, cognome Pierre, o último exilado em Paris; e o argentino Gardelón, famoso pelo bordão “Muy amigo!”.
Jô Soares deixou a equipe de “Planeta dos Homens” em 1981 para se dedicar a seu próprio programa, o “Viva o Gordo”, escrito por Max Nunes, Hilton Marques, Afonso Brandão e José Mauro, que foi exibido até 1987.
O título veio do show “Viva o Gordo e Abaixo o Regime!”, um grande sucesso do teatro no qual o humorista fazia críticas veladas à ditadura. Entre os tipos marcantes que viveu nessa época, estão o Reizinho, sempre às voltas com os problemas do reino, uma sátira à situação política do país; o Capitão Gay, super-herói homossexual que usava um uniforme cor de rosa e andava sempre acompanhado de seu ajudante Carlos Sueli (Eliezer Motta); e o Zé da Galera, que ligava para o técnico da seleção brasileira de futebol e pedia “Bota ponta, Telê!”.
Simultaneamente ao trabalho no “Viva o Gordo”, Jô Soares apresentava um quadro no “Jornal da Globo” e, em 1983, fez uma participação especial no musical infantil “Plunct, Plact, Zuuum”.
Em 1987, Jô deixou a Globo e foi trabalhar no SBT, onde estrelou o humorístico “Veja o Gordo” e realizou um sonho que acalentava há anos: apresentar um programa de entrevistas inspirado nos talk-shows americanos, o “Jô Soares Onze e Meia”.
“Não foi uma mudança radical, mas uma continuação do meu trabalho de humor e também de jornalismo. Trabalhei no jornal Última Hora durante quatro anos, escrevi na Folha de S. Paulo e na revista Veja. E tem um lado de entrevista irreverente que só eu posso fazer, com os políticos”, disse ele ao “Memória Globo”.
Ao longo dos 11 anos em que o programa ficou no ar, Jô fez mais de seis mil entrevistas, com grandes personalidades brasileiras e internacionais – como o ex-presidente da União Soviética Mikhail Gorbachev e Bill Gates, fundador da Microsoft – e figuras anônimas. E durante o processo do impeachment do presidente Fernando Collor, o “Jô Soares Onze e Meia” funcionou como uma espécie de tribuna popular, com o apresentador entrevistando alguns dos principais implicados e testemunhas do caso.
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