Diretor do SBT diz que só a Globo pode absorver fracassos

Por - 12/01/11 às 15:46

Divulgação/SBT

Um dos primeiros profissionais a chegar diariamente aos estúdios do Complexo Anhanguera, em São Paulo, Reynaldo Boury – que assina a direção geral de Amor e Revolução, trama de Tiago Santiago, com estreia prevista para março, no SBT – gosta de ter domínio sobre todos os assuntos que envolvem o novo folhetim das 22h. Exigente, ele confere de perto todo o processo de criação de caracterização, figurino, produção de arte, trilha sonora e usa seus 55 anos de experiência – parte deles divididos entre passagens pela Globo, Excelsior e Tupi, onde começou como operador de câmera – para apontar os caminhos possíveis para que o projeto torne-se um produto de qualidade.

Irreverente, em 2008, aos 76 anos, Boury dirigiu a novela Minha Terra Minha Mãe que a sua filha, a autora Margareth Boury, escreveu para a Televisão Pública de Angola (TPA), levada ao ar no ano seguinte no país. O trabalho feito a toque de caixa tornou-se um grande sucesso de audiência.

“Essa novela foi produzida e gravada no Rio com a participação de 23 atores angolanos que passaram seis meses trabalhando no Brasil, ao lado de artistas daqui. Esse trabalho foi um grande sucesso lá fora. Os angolanos são fãs das novelas brasileiras e por isso resolvemos ambientá-la no Rio”, conta.

Após alguns meses de férias, Boury encontrou o amigo e dramaturgo Tiago Santiago que o convidou para fortalecer o casting do SBT e assinar suas próximas três novelas. A primeira, Amor e Revolução, uma trama de época – ambientada entre 1964 e 1972 – que terá investimento de R$ 3,5 milhões distribuídos em 180 capítulos, que contam ainda com a colaboração do diretor Luiz Antônio Piá, além da produção-executiva de Sérgio Madureira, recém-chegado da Globo.

Empolgado com o projeto, Boury contou a O Fuxico que enfrenta alguns problemas de pós-produção, confessou que não conseguiu formar o elenco estelar que desejava, mas se disse feliz na nova casa, que oferece um tratamento especial a seus funcionários. Confira.

O Fuxico: Quais são suas expectativas para sua estreia no SBT?

Reynaldo Boury: As melhores. Entrei no SBT para superar qualquer tipo de problema e fazer um produto de qualidade. Estou feliz por dirigir a primeira novela totalmente focada na ditadura militar. Há alguns anos, o Tiago Santiago apresentou essa sinopse para a Globo, que não se interessou por essa história ficcional contada dentro desse período tão importante da nossa história. Agora, o público vai relembrar fatos históricos, com direito a reportagens da época sobre o AI5, por exemplo, que os personagens vão assistir na tevê. Fizemos uma pesquista fantástica e tenho certeza que faremos uma ótima novela.

OF: Foi difícil escalar o elenco que desejava?

RB: Sim. Não temos um elenco estelar como eu planejava… Quando dirigi grandes produções na Globo, como a novela Tieta, era bem mais simples… Mas, desta vez, todos os nomes que queríamos escalar já estavam comprometidos com a Globo ou com projetos no cinema. Mas fechamos um elenco redondo, com profissionais muito talentosos e conhecidos do público.

OF: Que astros o senhor tentou contratar?

RB: Procuramos o Selton Mello para viver o militar José Guerra, mas ele estava comprometido com uma produção de cinema. Conversamos com Rodrigo Santoro para interpretar o galã, mas disse que também começará a filmar fora do País… Para viver a Maria, a mocinha da história, queria muito a Luana Piovani. Ela estava no Festival de Veneza e me mandou um e-mail dizendo que tinha um outro projeto, mas que adoraria trabalhar comigo em uma outra oportunidade. Agora estou satisfeito com meus protagonistas.

OF: O que falta no SBT para competir com o padrão de novelas da Globo?

RB: Investir alto em equipamentos de pós-produção. Disse isso ao Silvio Santos, mas ele precisa firmar a audiência para ter condições de apostar mais no núcleo de teledramaturgia do SBT, que ainda não dá lucro para a empresa. Mas ele está confiante. Pela primeira vez, uma novela da emissora irá ao ar antes de ser inteiramente gravada. Ele deu essa oportunidade ao Tiago por respeitar seu talento.

OF: Como foi seu encontro com o Silvio Santos?

RB: Ele me chamou na sala dele e perguntou quanto eu queria ganhar para assinar um contrato de três anos. Eu disse o valor e não levamos mais do que dez minutos para fechar todos os detalhes. Ele é um empresário sensato, tem um raciocínio lógico fantástico e me contou que as novelas ainda dão prejuízo ao SBT. Mas Silvio acha que tem uma obrigação moral com seu público e quer agradar aqueles que gostam de ficção. Por isso, vamos trabalhar duro para que essa novela emplaque.

OF: Qual sua meta de audiência?

RB: Trabalharei em cima da realidade do SBT. Se conseguirmos manter uma média de 10, 12 pontos, estarei satisfeito. Acho que é possível.

OF: Em Amor e Revolução vocês vão seguir uma linha usada por Manoel Carlos e Gloria Perez, exibindo no final do capítulo depoimentos verídicos de pessoas que foram torturadas na ditadura. Não tem medo de críticas?

RB: Claro que não. Como diria o Chacrinha, nada se cria… Vamos copiar uma fórmula que deu certo e é bastante interessante para este projeto. Estamos em busca desses guerrilheiros para gravarmos 180 depoimentos. O público vai ver no ar uma novela com um texto muito bom e imagens cheias de emoção.

OF: Acha que a presidente Dilam Rousseff vai dar seu depoimento para a novela?
RB: O convite foi feito mais de uma vez. Sabemos que ela estava em campanha e aguardamos. Depois que foi eleita sua agenda estava lotada… Mas esperamos que ela possa exercer seu papel de cidadã e contar ao público um pouco do que viveu em sua luta pelo fim da ditadura. O momento é ideal.

OF: O senhor tem fama de ser um diretor exigente. O que o tira do sério?

RB: Sou do tempo em que ator e diretor estudavam muito o texto antes de chegar no estúdio. Faço isso até hoje. Mas já trabalhei com atores que desrespeitavam seus colegas chegando atrasados, sem decorar texto… Não gosto de trabalhar com pessoas egoístas, que apenas lêem seus capítulos e ignoram o restante da trama. Não vou dar nomes, mas tem atores que me irritaram muito ao longo da minha carreira e que me deixam sem ânimo em ir trabalhar na Globo. Comigo esses caras não trabalham mais.

OF: O senhor já assinou tramas de sucesso na Globo como Tieta, que tinha um alto investimento. Ao chegar no SBT sentiu dificuldade devido à crise enfrentada pelo Grupo?

RB: De jeito nenhum. Tenho uma longa carreira e nunca trabalhei em uma empresa que cuida tão bem dos seus funcionários. As pessoas falam em crise, mas desde que estou aqui, o SBT nunca atrasou salário de ninguém nem cortou verba dos capítulos. Fiquei impressionado ao saber que os funcionários recebem em casa uma cesta básica, tem um ótimo plano de saúde, desconto na farmácia, ônibus de graça para diversos pontos da cidade e uma série de benefícios que nunca vi em outra emissora. Então me diga: onde está a crise?

OF: Apesar da empresa oferecer esses benefícios todos, a Globo continua sendo a melhor vitrine. Não sente falta disso?

RB: Tenho 78 anos e ainda busco desafios. Há dois anos, deixei os projetos no Brasil para dirigir a novela Minha Terra Minha Mãe que a minha filha (a autora Margareth Boury) escreveu para a Televisão Pública de Angola (TPA) e me senti realizado com a experiência. A Globo projeta quem ela deseja. É a única emissora no mercado que pode se dar ao luxo de absorver fracassos. Aliás, nos últimos tempos, ela lançou alguns projetos de baixíssima audiência assinadas por ‘amigos’ da casa. Porém, nenhum atrapalhou a saúde financeira da rede. Autores como minha filha, não tinham espaço na Globo, mas ganharam vitrine na Record. Eu quero fazer com que com o público se acostume a assistir às novelas SBT que, aos poucos, vão trazer mais anunciantes para o horário. A Globo construiu sua história com muita determinação e trabalho. Faremos o mesmo. Quero ajudar o SBT a ser uma fábrica de sucessos.

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