Entrevista: Murilo Rosa acha hipócrita o ator que diz: “Não quero fazer televisão”
Por Redação - 12/01/13 às 10:11
Diversificar os papéis que interpreta na tevê já estava nos planos de Murilo Rosa. Depois de emendar uma sequência de heróis românticos – como o Solano de Araguaia, o Lucas de Caminho das Índias e o Miguel de Desejo Proibido, entre outros, ele queria mesmo era encarnar um vilão. Assim que a trama de Walther Negrão chegou ao fim, divulgou para todos na Globo a sua vontade. Inclusive, para Marcos Schechtman, que havia dirigido Araguaia. E foi o próprio diretor que convidou Murilo para viver o capitão Élcio, em Salve Jorge.
"Era exatamente o tipo de papel que eu queria fazer", assegura.
"Estreei na Globo como um vilão, em Chiquinha Gonzaga. Mas, depois disso, fiz só personagens engraçados ou românticos ou sérios. Estava com essa vontade e aceitei de cara", completa.
Na televisão desde 1994, quando atuou em 74.5 Uma Onda no Ar, exibida pela extinta Manchete, e em Confissões de Adolescente, da TV Cultura, Murilo procura não limitar sua área de trabalho. Para ele, fazer cinema e teatro influencia diretamente na qualidade de seus personagens da tevê e vice-versa.
"Acho que o ator tem de estar disponível para o bom papel, apenas isso. O resto vem", simplifica.
Mas o discurso de Murilo é bem realista no que diz respeito à dramaturgia no Brasil.
"Se você quer ser um ator profissional, sustentar seu filho, sua família, vai ter de acontecer em vários lugares: na televisão, no teatro, fazer bons filmes, entrar no mercado publicitário, que é uma coisa para poucos", avisa.
O Fuxico: Na trama de Gloria Perez, Élcio é o antagonista do mocinho Théo, de Rodrigo Lombardi. Mas, apesar disso, o personagem tem momentos de descontração e humor. Como dosar esses dois lados?
Murilo Rosa: O espectador é muito preso a uma boa lágrima, a um bom beijo, ao bom humor. E o Élcio é mulherengo, tem humor, que é um sinal de inteligência, e dureza nas horas certas. Eu sempre quis que esse personagem fosse um vilão que tivesse o seu tempero. Sempre quis ele aprontasse, mas que tivesse seu poder de sedução, como todo bom vilão eu acho que tem de ter. Como diz o Sérgio Britto (ator, diretor e roteirista) quando você entra no palco: as pessoas têm de ter vontade de te ver. O Élcio quer derrubar o Théo. Mas eu sempre quis fazer desse personagem um cara que as pessoas, de uma certa forma, não gostassem, mas que também se sentissem atraídas.
OF: Você ficou uma semana na AMAN – Academia Militar das Agulhas Negras – para entender o universo do personagem. Até que ponto essa preparação foi importante para seu trabalho de composição?
MR: Foi uma base muito importante para a construção do personagem. O primeiro passo foi entender como funciona o exército e essa semana que passamos lá foi fundamental para compreender a importância dele, que a gente não sabe. O exército tem mais de 80 ações pelo mundo. Posso dizer que um capitão do exército, que é o personagem que eu faço, é um homem preparado, que está pronto para um problema. Também foi bom para fazer as aulas práticas de tiro e hipismo.
OF: Na televisão, geralmente, você é mais visto na pele de mocinhos. A que atribui essa escalação recorrente?
MR: A televisão acaba sendo um lugar em que querem aproveitar o mais identificável. Acho que foi dando certo e foi se repetindo. Mas, ao mesmo tempo em que existe um rótulo por fora, são personagens diferentes. Fiz o Solano, que era um domador de cavalo; um padre, em "Desejo Proibido"; o Dinho, em "América", era um personagem mais cômico. Mas todos com essa conotação de herói. Então, acho que é bom dar uma quebrada. No cinema, as pessoas têm me chamado para várias outras funções.
OF: O herói, geralmente, tem um perfil previsível dentro de uma trama. Acredita que interpretar vilões seja mais interessante?
MR: Não. Acho que o interessante é fazer um bom papel. Você pode fazer um mocinho, mas ele ser tão complexo que vai ser um personagem muito interessante. Mas, com um vilão, posso fugir do politicamente correto, fazer o que eu quiser. Se alguém ficou com raiva de mim, ótimo. Se gostou, ótimo também. Com um mocinho, tem de tomar cuidado.
OF: O posto de galã, que tanto acompanha sua trajetória, já incomodou você?
MR: Não. Nunca incomodou e acho que nunca prejudicou. Na verdade, eu tenho um tipo físico bem normal, de um cara brasileiro, tendo uma tendência a um tipo mais europeu. Mas com o meu perfil posso fazer qualquer personagem. Acho que o galã está muito mais ligado à sedução, ao poder que você tem de seduzir, do que ao tipo físico.
OF: Você estreou na tevê em 1994 e três anos depois já estava interpretando seu primeiro protagonista, o Tenente Aquiles, em Mandacaru, da Manchete. O tamanho de seus personagens e a relevância deles em uma trama se tornou mais importante para você com o passar do tempo?
MR: Acho que chega uma hora em que você não pode mais fazer um personagem que não seja bom. Se você já fez, tem de conduzir a carreira e tomar cuidado para que isso não aconteça. A minha carreira sempre foi ascendente, degrau por degrau. Meus personagens foram evoluindo. Acho importante, sim, você ser um ator que queira assumir a responsabilidade, protagonizar uma novela, um filme, uma produção teatral. Acho que esse é o objetivo do ator. É só não colocar isso apenas como o foco principal. O papel tem de ser o foco principal.
OF: Você já fez muitos trabalhos de época. Entre eles, Xica da Silva, exibida pela Manchete em 1996, Chiquinha Gonzaga, de 1999, e A Casa das Sete Mulheres, de 2003, entre outros. Com tantas obras nesse estilo no currículo, também era um desejo seu atuar mais em produções contemporâneas?
MR: Como eu sempre fiz muita época, sempre quis fazer trabalhos mais contemporâneos. Se for ver meus trabalhos na Globo, muitos são de época. Então, sempre quis fazer papéis contemporâneos assim como o Élcio. Acho que é mais fácil fazer uma coisa atual.
OF: Mas, por outro lado, não é mais difícil se distanciar de um personagem atual, dependendo do perfil dele?
MR: É, mas tem gente que faz época sem também mudar muita coisa. Acho que, se você quer fazer um bom trabalho de época, de composição e tudo, é mais difícil do que um contemporâneo, que você já mais ou menos conhece, pega alguns elementos. Época não. É preciso construir uma situação.
OF: Quando você decidiu se dedicar à interpretação, no início dos anos 1990, em algum momento, fazer televisão passou a ser um objetivo de carreira?
MR: Sim. É balela essa coisa de falar: "Ah, eu só faço teatro". O ator que quer ser profissional vai querer ser um ator de cinema, de televisão e de teatro. A coisa mais hipócrita que eu já escutei na minha vida é quando vejo um ator falando: "Não quero fazer televisão". Até aparecer uma oportunidade. E eu estou falando isso porque já passei por essa fase na escola de teatro. Bicho grilo, barba grande, estudando Tchekhov (Anton, dramaturgo russo) e cheio de teorias… A dramaturgia brasileira é a melhor do mundo. Para mim, a Globo faz um trabalho excepcional. Então, só se você for burro para não querer fazer parte disso.
OF: Você se mudou de Brasília para o Rio de Janeiro, em 1992, para estudar teatro. E sua estreia na tevê foi dois anos depois – um processo, relativamente, rápido. Que recordações têm daquela época?
MR: Vim na cara e na coragem para fazer escola de teatro e rolou. Vim com o apoio dos meus pais, mas sem um emprego. Uma prima distante do meu pai indicou uma outra escola de teatro – eu já tinha feito, durante um tempo, um curso profissionalizante em Brasília. No Rio, entrei em uma escola de teatro, fiquei um tempo e fui parar no Tablado, onde comecei a fazer uma peça com a Maria Clara Machado. As coisas foram acontecendo. Eu vim muito focado. Meu pai e minha mãe sempre foram exemplos de pessoas que ralaram muito. Então, vim com um objetivo: tinha de dar certo.
OF: E acredita que chegou onde imaginava estar?
MR: Estou caminhando. Mas acho que está tudo certo, tudo indo bem.
OF: Com mais de 20 trabalhos na tevê, que personagem destaca em sua trajetória?
MR: É tão complicado isso porque primeiro trabalho é primeiro trabalho, que foi 74.5 Uma Onda no Ar. Depois, a gente brincava e chamava de 74.5 Uma Bomba no Ar. Mas eu vesti a camisa. Lembro até hoje que fui assistir a uma peça, em 94, e o ator que fazia a peça era da Globo. E ele fez uma brincadeira no palco sacaneando, falando o nome da novela, menosprezando. Fiquei com tanta raiva naquele momento. É o seu trabalho, né? O personagem CD – Carlos Daniel – foi meu primeiro e começou a assumir responsabilidades na trama. A novela não foi boa, mas foi importante para mim. Acho que todo personagem é. Internamente, eu valorizo quase todos.
Mudança de planos
Por pouco, Murilo Rosa não seguiu outro caminho profissional. Ainda em Brasília, sua cidade natal, ele chegou a cursar a faculdade de Educação Física. Mas não demorou muito para descobrir que não era apaixonado pelo curso.
"Eu fui atleta, então achava que era legal. Mas percebi que não queria ser professor de Educação Física lá na faculdade", conta.
Foi quando se interessou pelas Artes Cênicas e resolveu investir pesado na carreira de ator, aos 20 anos. Até então, nunca havia tido nenhum contato com a interpretação. No ano seguinte, em 1992, se mudou para o Rio e, em 1993, participou de uma Oficina de Atores da Globo. Mas o material em vídeo de Murilo acabou sumindo e ele não recebeu nenhuma resposta da emissora. Só depois de acumular trabalhos na Manchete, TV Cultura, SBT e participações em Malhação e Você Decide é que Murilo foi de vez para a Globo, a convite de Jayme Monjardim, para viver o Amadeu de Chiquinha Gonzaga, em 1999.
"Estou muito feliz lá. Mas a experiência em outras emissoras foi muito positiva. Trabalhar com o Walter Avancini é uma coisa nica na carreira de um ator", exalta Murilo, que foi dirigido por Avancini em Xica da Silva e Mandacaru, ambas na Manchete, e também em A Padroeira e O Cravo e A Rosa.
Em plena forma
Interpretar um capitão do Exército exige um pouco mais da preparação física de Murilo. Por isso, ele costuma correr e malhar com frequência. Tudo para estar de acordo com o que o perfil do personagem pede.
"Um capitão é o homem mais importante em uma batalha, ele tem de estar preparado. Então, eu precisava estar mais magrinho, mas um magro ágil", explica.
Trajetória Televisiva
# "74.5 Uma Onda no Ar" (Manchete, 1994) Carlos Daniel.
# "Antônio Alves, Taxista" (SBT, 1996) – Henrique.
# "Xica da Silva" (Manchete, 1996) Martim Caldeira.
# "Mandacaru" (Manchete, 1997) Tenente Aquiles.
# "Chiquinha Gonzaga" (Globo, 1999) Amadeu.
# "Força de um Desejo" (Globo, 1999) – Eugênio.
# "O Cravo e A Rosa" (Globo, 2000) Celso de Lucca.
# "A Padroeira" (Globo, 2001) Diogo.
# "Brava Gente, Ariosvaldo e O Lobisomem" (Globo, 2002) Lobisomem.
# "A Casa das Sete Mulheres" (Globo, 2003) Afonso Corte Real.
# "Um Só Coração" (Globo, 2004) – Frederico.
# "América" (Globo, 2005) – Dinho.
# "Bang Bang" (Globo, 2006) Josh Lucas.
# "Desejo Proibido" (Globo, 2007) Miguel.
# "Caminho das Índias" (Globo, 2009) – Lucas.
# "Araguaia" (Globo, 2010) Solano.
# "Salve Jorge" (Globo, 2012) – Capitão Élcio.
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