Talitha Morete reproduz racismo estrutural no ‘É de Casa’ e Manoel Soares dribla o desconforto
Por Flavia Cirino - 14/06/22 às 08:11
Participar do programa “É de Casa”, no último sábado, 11 de junho, apresentado nas manhãs de domingo na Globo, era pra ter sido uma grande realização na vida de Silene, uma vendedora de cocadas. Mas acabou se transformando em um grande inconveniente. Uma das apresentadoras do programa, Talitha Morete convidou uma doceira a fazer uma receita de cocada e infelizmente reproduziu uma situação racista, ao vivo.
Silene vende cocadas em um salão de beleza que Morete frequenta no Rio de Janeiro, o que gerou o convite para que ela fizesse a receita no programa. Na atração, as duas chegaram a prepara a guloseima juntas.
Até que Talitha pediu que a cozinheira servisse cocadas para os demais convidados do programa semanal.
“A dona da cocada vai fazer as honras da casa. Vai servir todo mundo, Silene! Por favor, pode oferecer porque está todo mundo querendo”, pediu a apresentadora.
Silene chegou a pegar bandeja para começar a servir os outros quando Manoel Soares, também apresentador do programa, interveio. O jornalista, engajado em pautas antirracistas, percebeu a situação embaraçosa, levantou, e imediatamente se ofereceu para servir os doces no lugar da cozinheira.
“Vamos fazer o seguinte? Eu vou ser o seu garçom e você vai me orientar para quem vou servir, porque você não vai servir ninguém”, disse ele, pegando a bandeja e distribuindo os doces entre os presentes.
Nas redes sociais, a reação dos internautas foi imediata à atitude de Talitha, mesmo que a apresentadora não tivesse a intenção: “Aula de como lidar com o racismo estrutural. Parabéns, Manoel Soares”, disse um tuiteiro. “Meu Deus, que incômodo esse vídeo provoca”, apontou outra pessoa.
“A Talitha, literalmente, cruzou o cenário só pra fazer a mulher servi-la… Estou em choque! O Manoel não conseguiu esboçar nenhuma reação porque acredito que nem ele estava acreditando no que estava acontecendo ali. Ainda bem que conseguiu se recompor e dar a lição”, destacou uma cozinheira.
Tia Má fez questão de se pronunciar sobre o assunto: “Sabe o que queria mesmo? Que dona Silene viralizasse…que tivesse várias encomendas, que as cocadas dela virassem um iguaria disputada…vamos seguir @cocadasdasilene e celebrar essa mulher…que está pronta para ser servida e receber muito afeto de todos nós! Mais carinho e menos servidão para as nossas!”.
ENTENDA O QUE É RACISMO ESTRUTURAL
Trata-se da naturalização de ações, hábitos, situações, falas e pensamentos que já fazem parte da vida cotidiana do povo brasileiro, e que promovem, direta ou indiretamente, a segregação ou o preconceito racial. Um processo que atinge tão duramente — e diariamente — a população negra.
Em nosso dia-a-dia estão normalizadas frases e atitudes de cunho racista e preconceituoso. Piadas que associam negros e indígenas a situações vexatórias, degradantes ou criminosas. Inclui também atitudes baseadas em preconceitos, como desconfiar da índole de alguém pela cor de sua pele.
Outra forma comum de racismo é a adoção de eufemismos para fazer referência a negros ou pretos, como as palavras “moreno” e “pessoa de cor”. Essa atitude evidencia um desconforto das pessoas, em geral, ao utilizar as palavras “negro” ou “preto” pelo estigma social que a população negra recebeu ao longo dos anos.
Essas ações reverberam nas instituições públicas e privadas. No Estado e nas leis que alimentam a exclusão da população negra, que se materializam, por exemplo, na ausência de políticas públicas que possam promover melhores condições de vida a essa população.
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É jornalista formada pela Universidade Gama Filho e pós-graduada em Jornalismo Cultural e Assessoria de Imprensa pela Estácio de Sá. Ela é nosso braço firme no Rio de Janeiro e integra a equipe de OFuxico desde 2003. @flaviacirino