TDAH: Saiba tudo sobre o transtorno do qual Cleo foi diagnosticada

Por - 12/07/23 às 10:00

A cantora e atriz Cleo, sentada na grama e olhando para a câmeraFoto: Reprodução Instagram @cleo

No doimingo, 09 de julho, Cleo usou as redes sociais para contar, em vídeo, que é portadora de TDAH. A cantora revelou que o diagnóstico lhe trouxe um alívio, pois antes, tratava de forma errada, como depressão ou ansiedade. O TDAH significa Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade.

Essa condição afeta milhares de pessoas em várias partes do mundo e, segundo Cleo, o diagnóstico trouxe à ela um alívio, após anos de incompreensão sobre a doença.

“Pra quem não sabe, eu passei a minha vida inteira lutando pra entender porque eu tinha certos comportamentos; por quê a minha cabeça não funcionava da forma como as pessoas diziam que ela teria que funcionar, e aí cheguei ser diagnosticada com depressão, ansiedade, bipolaridade, um combo de coisas”, disse Cleo, em um dos momentos do vídeo.

OFuxico conversou com a Dra. Maria Inês Mesquita, Psiquiatra e Psicoterapeuta Cognitivo Comportamental, para saber mais sobre o transtorno. Confira:

OFuxico – O que é o TDAH?

Dra. Maria Inês Mesquita – O TDAH é um transtorno do neurodesenvolvimento causado pela interação entre os genes e fatores ambientais, que aparece na infância e frequentemente acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Ele se caracteriza por sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade. No TDAH temos uma imaturidade ou desregulação química das áreas cerebrais responsáveis por “nossos freios” e por coordenar nossa capacidade de planejar e executar ações. Pode ter manifestações distintas. Algumas pessoas TDAH podem ser predominantemente desatentas, outras predominantemente hiperativas e temos também os indivíduos com a combinação dos sintomas de desatenção e hiperatividade.

Dra. Maria Inês Mesquita, Psiquiatra e Psicoterapeuta Cognitivo Comportamental
Dra. Maria Inês Mesquita, Psiquiatra e Psicoterapeuta Cognitivo Comportamental – Foto: Divulgação

OFuxico – Como se faz o diagnóstico?

Dra. Maria Inês Mesquita – É feito através de uma detalhada avaliação clínica, a fim de buscar evidências suficientes para o diagnóstico. O especialista investiga o perfil dos sintomas, a história médica (desnutrição na infância, trauma, mãe fumou na gravidez? …são fatores ambientais que predispõe ao TDAH) e do desenvolvimento do paciente, também a história familiar (é um transtorno herdado geneticamente).  A informação de pais, professores e de pessoas que convivem com o paciente (criança ou adulto), são muito importantes, a fim de avaliar a presença, bem como a persistência dos sintomas ao longo do tempo (mínimo de 6 meses). Existem escalas e questionários para aplicar tanto para o paciente como para as pessoas que convivem com ele e que colaboram para o correto diagnóstico. Não existem exames de imagem ou de sangue que colaborem para o diagnóstico.
 
OFuxico – Quais os sintomas mais comuns?
 
Dra. Maria Inês Mesquita – O TDAH se caracteriza por uma combinação de dois tipos de sintomas: Desatenção e Hiperatividade-impulsividade, que estão presentes de forma constante, como um padrão crônico de funcionamento do indivíduo, e em variados contextos da vida da pessoa. Se associa a dificuldades na escola/trabalho e nos relacionamentos. As pessoas com esta condição parecem “viver no mundo da lua”, são “estabanadas” e não param quietas por muito tempo. Podem apresentar muitos problemas de comportamento, como dificuldades com regras e limites. São desatentas para atividades do cotidiano e muito distraídos. São inquietas, vivem mudando de uma coisa para outra e agem sem pensar, colhendo prejuízos importantes na vida social, familiar, escolar/laboral e pessoal. Eles têm dificuldade em avaliar seu próprio comportamento e o quanto isto afeta os demais à sua volta. Com muita frequência eles têm comorbidades, como o uso de drogas, álcool, ansiedade e depressão. Também é importante reconhecer que os sintomas principais de TDAH podem ter uma “aparência” diferente na vida adulta. A hiperatividade em adultos geralmente se manifesta como inquietação ou agitação interna, uma sensação de não ser capaz de relaxar ou de precisar de álcool ou drogas para relaxar ou dormir. Por vezes, também se manifesta na incapacidade de parar de falar ou de manter-se em atividades. Intimamente relacionado à impulsividade está o fenômeno da “busca de sensações”, “busca de novidades” ou “busca de excitação”, que se manifesta como a necessidade e a procura por novos estímulos, diversidade, prazer e mudança constante.
 
OFuxico – Qual especialidade médica deve-se procurar para ter o diagnóstico correto?

Dra. Maria Inês Mesquita – O profissional que trata o TDAH pode ser um Psiquiatra ou um Neurologista Clínico. É importante que seja um profissional capacitado nessa área para que seja feito um diagnóstico correto.
 
OFuxico – Existe cura para o TDAH?
 
Dra. Maria Inês Mesquita – O TDAH atinge cerca de 5% das crianças e, embora haja uma redução dos sintomas com o passar dos anos – até 65% apresentam remissão parcial -, apenas 15% das crianças com TDAH apresentam remissão completa. Uma pesquisa recente sugere que a persistência da síndrome de TDAH completa na vida adulta depende de inúmeros fatores, como severidade dos sintomas na infância, presença de comorbidades mentais na infância e transtornos mentais nos pais.
 
OFuxico – Qual tratamento? Exige acompanhamento constante, para o resto da vida?

Dra. Maria Inês Mesquita – Dra. Maria Inês Mesquita – O TDAH deve ser encarado como condição crônica que requer tratamento contínuo para seu manejo eficiente. Não foi encontrado tratamento que cure o transtorno, porém há muitos tratamentos que podem efetivamente ajudar. O principal entre eles, no caso das crianças, é a educação da família e dos professores da escola sobre a natureza do TDAH e seu manejo, no caso dos adultos a educação e o aconselhamento do paciente e dos membros de sua família. Entre os tratamentos medicamentosos que resultam no maior grau de melhora nos sintomas do transtorno, estão as medicações estimulantes como o Metilfenidato (Ritalina). A combinação com psicoterapia ajuda o portador a reconhecer e manejar os sintomas, promover mudanças no estilo de vida, a adesão à atividade física, sono de qualidade, alimentação saudável e suplementação nutricional trazem ganhos a longo prazo, que podem permitir reduzir a dosagem da medicação ou até mesmo dispensá-la, dependendo da gravidade do transtorno.
 
OFuxico – Por que o TDAH pode ser confundido com outros transtornos, como a depressão, ansiedade?

Dra. Maria Inês Mesquita – Indivíduos com TDAH apresentam alta taxa de comorbidades com outros transtornos psiquiátricos (70 a 80% dos indivíduos afetados têm pelo menos um outro transtorno). Crianças com TDAH são cinco vezes mais propensas a ter depressão e três vezes mais de ter um transtorno de ansiedade. Em adolescentes e adultos, comorbidades também são relevantes clinicamente, incluindo: Transtornos alimentares, Transtorno por uso de substâncias, Transtorno bipolar e Transtornos de personalidade. Esse perfil de comorbidades desafia a avaliação diagnóstica. Precisamos também levar em conta que a desatenção e a dificuldade na execução de tarefas podem estar presentes em outros transtornos psiquiátricos. Pessoas ansiosas constantemente desviam sua atenção para seus pensamentos de preocupação podendo ser confundido com a desatenção encontrada no TDAH. Alguns sintomas de TDAH e depressão são parecidos, incluindo dificuldade de memória, desmotivação, procrastinação, desorganização, irritabilidade, desinteresse e baixa autoestima.
 
OFuxico – O TDAH escolhe o gênero, digo, mais mulheres ou mais homens podem ter o transtorno?
 
Dra. Maria Inês Mesquita – As pesquisas atuais já demonstram que a proporção de mulheres e homens com TDAH é de 1 para 1, portanto o TDAH não faz distinção de sexo.  Os meninos tendem a ter mais sintomas de hiperatividade e impulsividade que as meninas, geralmente o problema é identificado na escola, pois é um aluno que perturba a sala de aula. Já as meninas podem apresentar apenas o tipo desatento e passa desapercebido o transtorno durante os anos escolares. Neste sentido, é fundamental observar as meninas, especialmente se há ocorrências de casos de TDAH prévios na família, para que não cheguem a idade adulta sem diagnóstico, e acabem colhendo mais prejuízos.
 
OFuxico – Com que idade se pode descobrir? Só em crianças ou, quando adulto, a pessoa pode receber este diagnóstico?
 
Dra. Maria Inês Mesquita – O TDAH geralmente se manifesta na infância, na maioria das vezes entre os 6 e os 12 anos. Por vezes o diagnóstico é realizado tardiamente porque o prejuízo pode se evidenciar mais tarde na vida, por exemplo, quando o adolescente sai da casa dos pais e não tem mais a ajuda deles para lembrá-lo dos compromissos, arrumar seus pertences ou até o acordando pela manhã para que cumpra horários. Nesse caso o TDAH já existia e estava mascarado. Mais recentemente, estudos sugerem a possibilidade de um número de casos ter início tardio, após os 12 anos, mas isso é controverso sendo necessárias mais pesquisas.

A Dra. Maria Inês Mesquita é Psiquiatra e Psicoterapeuta Cognitivo Comportamental e mora em Florianópolis, Santa Catarina. Para contatos, o e-mail dela é mikjmesquita@hotmail.com

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