Faustão: Especialista revela que não é possível passar à frente na fila de transplante. Entenda!

Por - 21/08/23 às 17:17 - Última Atualização: 28 agosto 2023

Fausto Silva, o Faustão, com olhar sério, no palco de programa de TVFoto: Reprodução de TV

Conforme já noticiado no domingo, 20 de agosto, pelo Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, em seu boletim médico, Fausto Silva, necessita de um transplante cardíaco. O apresentador está internado na unidade desde o dia 05 de agosto e agora iniciou um tratamento de diálise, já se encontrando na lista de espera para transplantes sob a gestão do SUS.

A notícia pegou muita gente de surpresa e muitos, em redes sociais, questionam o motivo de Faustão estar na fila do SUS, sendo que ele tem plano de saúde. Pensando nisso, OFuxico conversou com o Dr. José Pedro Esteves Dias, médico cirurgião cardiovascular, especialista pela Sociedade de Cirurgia Cardiovascular, com experiencia em transplante cardíaco, que tirou algumas dúvidas como o tempo de espera na lista de transplantes, sobre a opção de espera com um coração artificial, o risco de rejeição, entre outros pontos relacionados a um transplante de coração.

Retrato do Dr José Pedro Esteves Dias, cirurgião cardiovascular, especialista pela Sociedade de Cirurgia Cardiovascular, com experiencia em transplante cardíaco
Retrato do Dr José Pedro Esteves Dias, cirurgião cardiovascular, especialista pela Sociedade de Cirurgia Cardiovascular, com experiencia em transplante cardíaco – Foto: Divulgação

Confira:

OFuxico – Dr. José Pedro, como funciona o SUS e por que a pessoa é cadastrada por lá para receber o órgão?

Dr. José Pedro – O transplante de órgãos do Brasil é regulamentado por uma lista que compete ao Sistema Único de Saúde (SUS) reger essa lista, que intercomunica vários centros de captação e transplante. Então, por exemplo aqui em São Paulo você vai encontrar o Incor, o Instituto de Cardiologia Dante Pazzanese, o Hospital São Paulo como referências para transplante cardíaco. Mas não é que somente ali que é realizado o transplante, você pode realizar transplante cardíaco em outro hospital como é o caso do Faustão, no Albert Einstein. Mas quem rege o andamento dessa lista, independente de cor, de raça, de sexo, de estar bem financeiramente ou não, é o Sistema Único de Saúde através dessa própria secretaria vinculada aqui em São Paulo à secretaria de saúde, que é um departamento de transplante cardíaco, tendo essa central que regula isso; transplantes de órgãos de modo geral.

OFuxico – Mas tem como passar à frente de quem está na lista?

Dr. José Pedro – Funciona da seguinte forma: se entrou um doador, que tem condições de doar os seus órgãos e a família assim o faz, pelo consentimento, é feita a retirada dos órgãos e é levado para o receptor que se encontra na sequência da lista. Ninguém passa na frente de ninguém, a não ser que o crossmet, que é todo esse déficit no caso de painel; no caso linfocitário toda este esses exames que avaliam compatibilidade do doador com o receptor não estejam batendo. Caso não estejam batendo, por exemplo, o receptor que está na frente ou não bate o tipo ABO RH, tipo sanguíneo, o índice de massa corporal, o perímetro não bate com o do doador, então esse receptor fica escanteado, vai para o segundo da lista. É obedecida a lista. No caso do Faustão, ele entrou para uma lista. Como se trata de transplante de coração, aí tem que ser realmente transplante de alguém que sofreu morte cerebral, assim como se fosse um transplante de córnea, ou de pulmão, que necessita de uma pessoa que veio a óbito pela parte cerebral. Se fosse transplante de rim, poderia ser, como doador, alguém vivo, ou o fígado, doando um pedaço do fígado, se fosse de medula também. Coração, pulmão, entre outros órgãos, exige que seja doador que teve morte cerebral.

OFuxico – Tem pessoas criticando, dizendo que ele vai passar à frente pela condição financeira. Isso pode acontecer?

Dr. José Pedro – De maneira alguma, não é a condição financeira que vai fazer passar à frente, mas sim, a compatibilidade. Como disse acima, se quem está na lista antes dele não for compatível para receber o coração que chegar, aí sim, ele poderia ser o receptor, caso haja compatibilidade. O Faustão está lá no Einstein, compensando a parte cardiológica com medicamentos endovenosos, até se acertar por via oral. Depois ele vai para casa dele, onde vai ficar aguardando o órgão do doador. Se aparecer um coração, dentro dessa sequência, não é o “ter mais dinheiro” que vai conseguir comprar, porque isso não pode, isso é contra a lei. Ele vai ter que esperar a vez dele chegar. Pode chegar rápido ou não. Por exemplo, quantos receptores estão aguardando no Einstein? [de acordo com o Sistema Nacional de Transplantes, o SNT, em nota divulgada na quarta-feira, 16 de agosto, estão na filha de espera cerca de 386 pessoas].

OFuxico – Daí, se aparecer algum coração compatível com ele…

Dr. José Pedro – Então, se aparecer algum coração que se adapte a ele e, teoricamente, os outros que estiverem na frente dele não tenham condição de receber o órgão por incompatibilidade, ele receberá logo. Hoje, no Brasil, há uma melhoria de doação de órgãos. A doação de coração, por exemplo, está muito maior, então, ele pode receber logo.

OFuxico – O transplante é um procedimento que traz maior sobrevida ao paciente?

Dr. José Pedro – Tecnicamente falando, o transplante de coração chega a ser até mais fácil do que operar uma coronária, por exemplo. O resultado é muito bom quando o receptor está em boas condições e a sobrevida é longa.

OFuxico – Ou seja, não existe a menor possibilidade de pagar por um órgão?

Dr. José Pedro – Isso não existe. Se tem uma coisa seríssima na legislação brasileira, é a doação de órgãos. É fiscalizado pelo Ministério da Saúde numa lista e pela Secretaria de Saúde.

OFuxico – E em caso de demora de receber um coração novo?

Dr. José Pedro – Pode acontecer, se estiver muito mal, aguardando o órgão, pode ficar internado com um coração artificial. Ele pode transitar pelo hospital com uma prótese artificial, por uns 60 dias no máximo.

OFuxico – Quais as chances de rejeição do órgão transplantado?

Dr. José Pedro – Hoje, com advento dos imunossupressores mais modernos, a chance de rejeição já ficou muito pequena. Então, todo o paciente que é transplantado, faz uma biópsia periodicamente 60 dias após o transplante; depois a cada 4 meses ou no máximo 6 meses, que é uma biópsia com a punção via jugular.

OFuxico – Como é feito isso?

Dr. José Pedro – Você põe uma pinça cirúrgica e vai até o ventrículo direito. Ali, a pinça tira um pequeno fragmento e vai acompanhando. Mas normalmente a rejeição costuma ser muito pequena para qualquer órgão doado, seja coração, seja rim… É por isso que se baseia: é fundamental você ter esse painel de linfócitos correto, não é só a compatibilidade de ABO RH. Existe um painel de linfócito, de macrófago, um painel imunológico que é feito para cruzar dados de um doador com receptor. Mas com muitas medicações novas e todos esses imunossupressores, é baixíssima a chance de rejeição.

OFuxico – Existe duração após transplante, por exemplo, depois de transplantado, o coração tem um tempo de vida útil?

Dr. José Pedro – Não é que seja vitalício, é que o paciente, uma vez transplantado, ele passa a ter uma sobrevida muito longa. É difícil prever se vai ser mais 15, 20 anos ou mais. Vai depender muito da condição do corpo dele, da idade dele. O Faustão é um sujeito que tem 73 anos, então, como é que está o fígado dele? Como é que está o rim dele; como é que estão os outros órgãos? Não é só colocar o coração ali, então, vai depender muito da condição de saúde do receptor. Mas não havendo rejeição, com o controle as medicações ministradas de maneira correta, a tendência é uma sobrevida mais longa do que você possa esperar.

OFuxico – Quais os riscos desse tipo de transplante?

Dr. José Pedro – O risco, como todo procedimento que envolve uma cirurgia de coração, com circulação extracorpórea, existe. Então, vamos lá, tem o risco de ter um sangramento durante o ato cirúrgico, por exemplo. Como todo o paciente que opera o coração, existe risco de vida e normalmente depende das condições dos outros órgãos, e me parece que ele (Faustão) está bem, clinicamente falando. Ele não está em uma UTI aguardando um leito, está no quarto, recebendo medicação. O resultado costuma ser muito bom nesses casos, até porque você está tirando um órgão doente e colocando um coração com uma boa contratilidade, uma função normal de uma pessoa que é doadora.

OFuxico – O senhor falou sobre o coração artificial. Ele poderia ir para casa com um home care e levar um coração artificial, até aparecer um doador compatível?

Dr. José Pedro – Não, o coração artificial; mecânico, só pode ser colocado e utilizado em ambiente hospitalar. Precisa de um acompanhamento e não pode ser domiciliar. O médico anticoagula o paciente, fica internado com esse coração artificial até que chegue o órgão definitivo.

OFuxico – Como o paciente chega até um pedido de transplante; quando se dá a necessidade de realmente ser um transplante de coração?

Dr. José Pedro – Então, no caso dele, do transplante cardíaco, a indicação é quando você desenvolve uma insuficiência cardíaca em que o coração fica grande, fraco e dilatado, com uma perspectiva de sobrevida em 18 meses, muito baixa. Então a insuficiência cardíaca grave, refratária ao uso de remédios, ela só tem uma solução hoje, quando a causa não pode ser recuperada com medicamento, cirurgias de ponte de safena ou um implante de marca-passo, só resta então o transplante cardíaco.

OFuxico – Quanto tempo o coração dura, após retirado do corpo do doador?

Dr. José Pedro – O coração é mantido numa solução cardioplégica, que a gente chama. Fazemos uma solução de cardioplegia no norte das artérias coronárias, para manter ele preservado. Essa solução é feita de potássio e o coração é mantido imerso numa uma solução aquosa com gelo por, no máximo, 4 horas. De duas a estourando o período, 3 horas e meia, 4 horas. Daí ele deverá ser implantado no receptor.

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