‘Falas Negras’: Força, trabalho e potência

Por - 20/11/21 - Última Atualização: 19 novembro 2021

Personagens do Especial Falas NegrasFoto: TV Globo/ Ronald Santos Cruz

Neste sábado, 20 de novembro, data em que se comemora o Dia da Consciência Negra, a TV Globo vai exibir o especial “Falas Negras”, que, além de enriquecer o debate sobre as questões raciais, contará na data de reafirmação da luta contra a desigualdade e a discriminação, histórias de cinco brasileiros que são referências em suas áreas de atuação ou cujas trajetórias servem de inspiração para suas comunidades. Com recursos narrativos que exaltam a potência da mão de obra preta e provocam a reflexão sobre o impacto histórico do racismo no mundo do trabalho, são histórias de caminhos trilhados com muita dificuldade, mas também atravessados por passos firmes que alcançaram grandes conquistas. 

“Decidimos fazer um ‘Falas’ com um diferencial que é trazer para o primeiro plano personagens que celebrem a força do seu trabalho e de sua existência como negros. Apesar de a mão de obra negra ter construído a riqueza desse país, essa riqueza nunca foi partilhada de forma justa com o povo preto. Se mudarmos no presente essa condição, se criarmos um novo imaginário, a partir do qual a pessoa preta possa ser o que quiser, sem nenhum tipo de julgamento, com certeza teremos um outro futuro”, afirma Naína.   

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OS PERSONAGENS 

Histórias da chef pernambucana Negralinda, do pedreiro baiano Geomar Rabelo, da professora mato-grossense Ana Fernandes, do produtor audiovisual gaúcho Cryston Rodrigues e da médica carioca Fátima Oladejo serão mostradas. Todos dão seus depoimentos em gravações realizadas nas cidades onde vivem.

“São personagens muito fortes, com histórias desafiadoras e inspiradoras. A partir do cotidiano dessas pessoas a gente reflete sobre o nosso presente, sem esquecer de como o passado nos trouxe a essa atual condição de desvantagem. Também apontamos para o futuro, um futuro que deve ser feito e narrado por pessoas pretas”, acrescenta Henrique.   

Geomar tem 32 anos, nasceu na cidade de Paripiranga, na Bahia, e ainda criança se mudou com a família para o município de São Vicente, em São Paulo. Assim como o pai, hoje ele trabalha como pedreiro e é missionário em sua igreja.

Tendo como uma de suas principais referências o pastor e ativista norte-americano Martin Luther King Jr., Geomar carrega nas suas palavras o desejo por uma sociedade mais igualitária: “Nunca me imaginei participar de um projeto como esse. Sou um migrante nordestino, operário, pedreiro, uma pessoa na multidão. Apesar de sermos a maioria, nós estamos menos representados nos espaços de poder. Então, é uma grande oportunidade de conhecerem não só a mim, mas também o que eu faço. E eu gostaria muito que as pessoas que vão assistir ao programa entendam a importância do respeito pelo outro. Precisamos praticar o amor com ações para que a gente tenha uma sociedade melhor, uma sociedade de respeito e não de exclusão”, afirma Geomar.

Nascido em Porto Alegre e morador do Morro da Cruz, Crystom tem 21 anos e divide seu tempo entre as entregas de uma hamburgueria e a divulgação de artistas negros da periferia da capital gaúcha, por meio do seu projeto Justiça Poética. Mais que um projeto pessoal, o Justiça Poética está alicerçado nos sonhos e na vontade de fazer acontecer de muitos jovens da periferia de Porto Alegre.

“Participar do ‘Falas Negras’ foi uma experiência inovadora e revolucionária. Eu trabalho com produção audiovisual também e foi a primeira vez que vi de perto um equipamento profissional. Espero que a minha história e o meu projeto inspirem muitos jovens, para que eles acreditem na luz no fim do túnel e não se distraiam dos seus sonhos”, destaca Crystom.

O respeito à ancestralidade conduz os passos da professora Ana Fernandes, de 35 anos. Natural de Vila Bela da Santíssima Trindade, no Mato Grosso, ela atua na educação quilombola e se orgulha de estar na mesma região onde um dia viveu Tereza de Benguela, líder de um dos mais importantes quilombos do país no século 18. “Gratidão e realização são as palavras que descrevem o que eu sinto com a oportunidade de participar do ‘Falas Negras’. A minha vida é dedicada à educação que, para mim, é primordial e essencial e devia ser vista com mais atenção e amor. Fico feliz de compartilhar um pouco da minha jornada”, destaca Ana.

A médica Fátima Oladejo, 38 anos, seguiu a mesma profissão do pai. Filha de um médico nigeriano com uma assistente social brasileira, a ginecologista carioca reforça o quanto foi fundamental para a sua vida o acesso às oportunidades. “Poder contar no especial um pouco da minha história e da minha família é algo que me dá um orgulho indescritível. Me ver nessa posição de representatividade é muito significativo para mim, como mulher preta, profissional e como mãe. O público pode esperar uma narrativa de positividade e esperança, entendendo que, através de oportunidades, podemos ser o que quisermos, desde que o ponto de partida seja o mesmo para todos”, afirma Fátima.

A chef e empreendedora Negralinda, de 33 anos, vê em seu bistrô comunitário a oportunidade de ajudar outras mulheres de Ilha de Deus, no Recife (PE). A região concentra um dos maiores manguezais urbanos do mundo e, por muito tempo, foi o lugar de onde a estudante de Gastronomia tirou seu sustento com a pesca de mariscos. “Esse reconhecimento, com a participação no ‘Falas Negras’, é extremamente importante para mim. É a minha história de vida, minha trajetória de luta, resistência e conquistas sendo compartilhada. Espero que as pessoas se identifiquem e possam se inspirar para ser o que quiserem”, ressalta Negralinda.

NOVAS PERSPECTIVAS

Se o presente é retratado com o mergulho nessas cinco histórias de vida, ao tratar do passado, o especial convida o público, através de um experimento social, a refletir sobre a persistência de um imaginário que, geralmente, relaciona pessoas negras a profissões de salários mais baixos e de pouco reconhecimento. Por fim, o programa vai contar com um momento que mira outras perspectivas daqui para a frente. Pensando em uma justa representação da população negra, dez artistas plásticos negros farão uma participação especial, garantindo a surpresa desta edição.

A convite da produção, participam voluntariamente os artistas Cety Soledad, Del Nunes, Diego Mouro, Kika Carvalho, Lidia Viber, Marcos da Matta, Mariana Sguilla, Marlon Amaro, Mulambö e Robinho Santana. Essa parte das gravações terá como cenário a exposição Yorùbáiano, do artista visual Ayrson Heráclito, em cartaz no Museu de Arte do Rio (MAR), no Rio de Janeiro.

No museu também será captada uma performance musical entre Alcione e o cantor e compositor carioca Caio Prado, em uma parceria inédita e exclusiva para o especial. Os dois cantam juntos a música “Não Sou Teu Negro”, composição de Caio que embala a abertura e marca a trilha sonora do especial. A canção, um manifesto antirracista, foi lançada no ano passado justamente no Dia da Consciência Negra.    

Em ‘Falas Negras’, assim como na primeira edição, além dos personagens do especial, a equipe é majoritariamente formada por pessoas negras. “Temos que pensar não só em pessoas pretas contando suas próprias narrativas, mas como narradoras do mundo também. Se narrar é construir mundos possíveis, universos compartilhados, só com pessoas pretas narrando, teremos uma nação dentro dessa terra”, acredita Naína. 

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É jornalista formada pela Universidade Gama Filho e pós-graduada em Jornalismo Cultural e Assessoria de Imprensa pela Estácio de Sá. Ela é nosso braço firme no Rio de Janeiro e integra a equipe de OFuxico desde 2003. @flaviacirino