Reynaldo Gianecchini: “Não sei ser fofo o tempo todo”
Por Redação - 04/05/14 às 10:14
A decisão de repassar toda sua vida numa biografia fez Reynaldo Gianecchini enveredar por caminhos delicados. O percurso proposto o levava a uma infância preservada na memória — de sabores, gestos e cheiros específicos — mas também a uma realidade ainda recente que, feito ferida aberta, causava incômodos. Vira e mexe, como numa costura de tempo e precisão, Guilherme Fiuza lidou com esses nós para conceber Giane — Vida, Arte e Luta. Já desfeitos, eles acentuavam uma característica marcante do seu biografado.
"Ele sofreu muito, um sofrimento quase desumano durante o transplante de medula. Giane não estava se abrindo sobre isso. ‘Tenho uma responsabilidade de não desencorajar as pessoas’, ele justificava. Mas foi uma negociação bem legal, na verdade. Foi sofrido, mas ele renasceu, e era importante não omitir isso”, lembra Fiuza em entrevista ao jornal Extra.
Giane enfrentou um câncer linfático e passou pelo transplante em janeiro de 2012.
"Pintá-lo como herói seria ignorar a bonita complexidade do homem sem superpoderes que ele é. A maneira como Giane encarou a doença, no entanto, acolhendo a esperança em vez da raiva, o colocou como referência, uma imagem já aproveitada pela ficção — nesta semana na novela Em Família, exibida na faixa das 21h, na Globo, Cadu, seu personagem, passará por um transplante do coração do qual também sairá vitorioso. O ator compreende a importância da sua história real – Só tem uma biografia legal quem tem coragem para viver, sustenta – mas esclarece".
"Não entro na pilha de querer ser exemplo. Que bom que posso ser um espelho. Mas não carrego esse peso de ser e querer corresponder a tudo. É o assunto favorito da minha análise: aprender a dizer não. Não consigo ser fofo o tempo todo. Depois dos 40 você começa a repensar isso tudo… Porque a gente não quer mais abdicar das nossas vontades para tentar agradar alguém", diz o ator de 41 anos, que recorda.
"Apresentei minha peça (A Toca do Coelho, em cartaz no Teatro Leblon) em Curitiba para um pÚblico de 2.500 pessoas. Fiquei mega-agradecido. Fiz o melhor trabalho que eu pude naquele palco. Era o que eu tinha para oferecer. Mas era impossível atender 2.500 pessoas. Então, fatalmente, saíram reclamando. Não posso dar uma energia que não tenho. Tem gente que não entende e eu não faço questão de ser fofo nessa hora. Tirei foto com 50, com 2.500 não dá".
Ao mesmo tempo em que busca deixar claro seus limites, ele não se cansa de expandir territórios, especialmente por causas com as quais se identifica. Giane conta receber, no mínimo, três pedidos por dia para participar de campanhas beneficentes. Claro, não consegue atender a todos, e é criterioso com suas escolhas.
“Só faço o que sei que vai ajudar", ressalta.
Devido à sua importante participação, foi nomeado embaixador do Graac (Grupo de Apoio ao Adolescente e à Criança com Câncer) e dá nome ao setor de radioterapia pediátrica do hospital, localizado em São Paulo.
O jornal conta ainda que Giane vem batalhando para construir em Birigui, sua cidade natal, o Instituto Professor Reynaldo Gianecchini, uma homenagem ao pai, morto em decorrência de um câncer em outubro de 2011 — todo o dinheiro que recebe pela biografia vai para o projeto. O espaço abrigará serviços de educação infantil, culinária e atendimento a idosos, e será coordenado por Heloísa Helena, mãe do ator.
Heloísa é uma companhia constante de Giane. Juntos, enfrentaram os percalços impostos à família e saíram deles mais fortes. A afinidade é constantemente lapidada em viagens, idas a teatro e ao cinema. Não à toa, ela se mostra tão empolgada quanto o filho ao falar da instituição.
“É maravilhoso ver o meu filho conseguir realizar este sonho que não é de agora, é de muitos e muitos anos atrás . Ele sempre falava que quando tivesse condições fundaria uma instituição de apoio às crianças carentes. Isto hoje é uma realidade", destaca ela, que aponta a generosidade de Giane como uma de suas fortes marcas.
“Ele foi sempre assim. Coração maior que ele, generoso, tem respeito pelo ser humano, otimista, gosta de usar as palavras eu posso, eu consigo, tem sempre a certeza que tudo vai dar certo. Acredita muito nas pessoas. Com a doença, amadureceu mais, tornou-se mais atencioso e paciente. Ele é alegre e ama a vida. Vive intensamente cada dia”.
"O sonho de Gianecchini se sustenta numa vontade de a cada dia ser um ser humano melhor”. Trata-se de uma frase clichê, é verdade, mas que encontra ressonância nas muitas histórias sobre ele. Os amigos, claro, dão a extensão desse querer bem. Giovanna Antonelli (sua parceira em inmeros projetos, incluindo a atual Em Família) o chama de “anjo” e “superprotetor de Birigui”. Claudia Raia, por sua vez, ressalta a capacidade do ator de perdoar.
"Giane perdoa de verdade. Mais do que um coração enorme, que tem lugar para todo mundo, ele não se apega a mágoas das quais às vezes a gente não consegue se livrar. Muita gente diz que perdoa, mas no fundo fica aquele ressentimento. Ele consegue perdoar até quem já tentou fazer mal a ele. Por ser assim, ele para mim é um ser que não é daqui desse planeta, é elevado, uma pessoa mais do que especial", conta Claudia, que teve um papel fundamental durante o processo de recuperação do amigo e chegou a ensaiar Cabaret, no quarto do hospital, às vésperas da estreia para alegrá-lo nos dias nublados.
Cercado de elogios por todos os lados, ele é o primeiro a ressaltar o óbvio.
“Não tem só mauzinho e bonzinho. Eu também me irrito”.
A aparência solar, de sorriso farto, muda quando ele se vê diante de questões pessoais mais íntimas. Aí sua expressão se torna sisuda e o tom grisalho do cabelo acaba por torná-lo, por um momento, completamente cinzento. Mas isso não é uma constante. A natureza discreta do ator, no entanto, tem raízes na infância. Quando pequeno, ele se refugiava numa goiabeira, terras da avó materna. Adulto e invariavelmente famoso, seguido pelos holofotes, busca se reservar ao máximo.
"Tento ir a lugares onde não tem paparazzo, é uma opção minha. Sou mais feliz assim. Ao mesmo tempo, não sou neurótico com isso. Tem gente que gosta de expor tudo e fazer da própria vida uma novela para as pessoas acompanharem. Eu não curto. Tem vezes que eu sei que vou dar uma entrevista, e eu me preparo. Quando não tem, eu meio que fujo".
Um dos assuntos que parecem testar a fronteira de resignação estabelecida por Giane é a possibilidade de ele ter filhos.
"Toda entrevista vocês querem me perguntar sobre isso, mas não tenho a menor expectativa. E acho que as pessoas buscam tapar um buraco com outras pessoas. Eu não. Tapo os meus vazios indo para dentro de mim. Não acho que ninguém nem nada preenche a não ser você. Nesse ponto, eu sou muito centrado. Acho linda a história de ter um filho. Acho que vai rolar, talvez”, explica o ator, solteiro, que descarta qualquer tentativa de produção independente.
“Só se aparecer uma mulher legal. Eu imagino como deve ser louco, porque um filho muda tudo na vida de um casal. E quando você perde um filho meio que abre um buraco no chão porque você montou sua vida inteira em cima de uma criança que não tem mais. Eu não tenho filho, mas tive perdas na vida. Eu estou falando de mortes, de relações, de deixar de estar junto das pessoas. Tive muitas perdas, de pessoas que não participam mais da minha vida. Uso tudo isso, esse espaço de saudade, de dor, afirma.
A noção de perda e o aprendizado que ela proporciona tem modificado a sua relação com a religião.
“Não aceito nenhum dogma, minha religião é aqui dentro”.
De certa forma, essa visão sobre si reforça outra característica marcante de sua personalidade — a facilidade de desfazer laços —, algo natural para alguém que saiu de casa aos 18 anos para tentar uma nova vida.
"Eu sou bom nisso mesmo (desfazer laços). Eu sou muito família, gosto dos amigos, mas tenho uma alma muito solta. Estou sempre pronto para viajar, para aceitar novos desafios da vida. Mas é porque eu não acredito que os laços se desfazem assim, partindo. Eu sempre acho que depois eu vou voltar, e as relações que têm que ficar vão ficar eternamente”, analisa Giane, que, entre laços feitos e desfeitos, ressalta a maturidade grisalha dos 40.
“Essa idade para o homem é maravilhosa. Nunca me senti tão bem quanto agora. Mas você começa a pensar no tempo depois dos 30 e tantos. Eu me sinto tão mais maduro hoje para lidar com tudo e isso me faz uma pessoa bem mais feliz. Busco cuidar do corpo para que os efeitos do tempo não sejam tão avassaladores. Essa é uma parte chata, não tem como falar que não. A gente quer ficar viril, jovem. Você não pode se entregar, aí é ladeira abaixo”.
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