Morte de Dora em ‘Vai na Fé’ mostra trecho de best-seller escrito por uma médica

Por - 20/07/23

Morte de Dora em ‘Vai na Fé’ mostrou trecho de best-seller escrito por uma médicaReprodução Globo

A cena da morte da Dora (Claudia Ohana) na novela “Vai na Fé” emocionou o Brasil na noite desta quinta-feira, 20 de junho. A novela, que vem marcando altos índices de audiência, exibiu cenas memoráveis protagonizadas por Claudia Ohana que encenou brilhantemente o momento final de sua personagem. Difícil imaginar alguém que não tenha se emocionado.

Para os momentos que mostraram a partida da Terapeuta holística, a autora Rosane Svartman usou trechos do livro  “A morte é um dia que vale a pena viver” da médica Ana Claudia Quintana Arantes, Geriatria e Gerontologia do Hospital das Clínicas da FMUSP, especializada em cuidado paliativo.

Enquanto Dora partia lentamente, Fábio (Zé Carlos Machado), seu marido,  leu um capítulo do livro que fala da  “Dissolução Dos Quatro Elementos” no processo da morte. O texto pode ser considerado um poema que leva à uma profunda reflexão sobre o processo da morte e suas etapas.

Morte de Dora em ‘Vai na Fé’ mostrou trecho de best-seller escrito por uma médica
Divulgação Globo

Abaixo o texto do livro, na íntegra:

“Os orientais nos falam dos quatro elementos da natureza: terra, água, fogo e ar. Como parte da natureza, também somos feitos deles. Quando morrermos, ocorrerá a dissolução dos elementos que compõem o nosso corpo.

Se pensamos na dissolução da terra, é mais ou menos óbvio que se trata da questão física, concreta, na pele; ao longo do processo de doença, ele ocorrerá mais ou menos rapidamente a depender da agressividade da doença. O corpo começará a se desintegrar.

Depois virá a dissolução da água. Biologicamente falando, a ‘’pessoa’’ tende a ficar mais desidratada e faz menos xixi. Diminui a produção de fluidos corporais, de secreções e enzimas do tubo digestivo e dos brônquios; as mucosas ficam mais secas. Os rins pararão de funcionar, porque esse é o momento de não produzir mais urina. Pacientes que experimentam a etapa da dissolução da água têm certo processo de comportamento muito característico: tendem a ficar mais introspectivos. Olham para dentro de si e para dentro da própria vida. Chega o momento da verdade, de encarar com honestidade o caminho percorrido. Então a família fala: ‘’ Você está triste? Não está reagindo? ’’ Sim, está reagindo. Está reagindo internamente. Mergulhando fundo como nunca antes, buscando a si mesmo dentro da própria essência. Porque nesse momento, em que estará se aprofundando na própria essência, começa a dissolução do fogo. É desse aprofundar-se que o paciente emerge pleno!

Na dissolução do fogo, cada uma das células tomará consciência de que o tempo está acabando, mas que ainda é tempo de vida. Sempre há tempo para ser o protagonista da própria vida, mas na dissolução do fogo encontramos o espaço de manifestação mais pleno dela. Estamos caminhando para o fim, mas agora o caminho fica mais belo e mais cheio de vida. Se cada uma das suas células percebe o fim, poderíamos pensar que haveria um caos de desespero, um estado de pânico celular e um colapso absoluto. Não, isso não acontece. Se tivéssemos sempre essa conexão com a nossa consciência celular, estaríamos vivendo o tempo inteiro em harmonia e equilíbrio. Quando cada uma das células se dá conta de que seu tempo aqui está se encerrando, elas se esforçam por mostrar, pela última vez, seu melhor estado de funcionamento. Então, as células do seu fígado se tornam hepatócitos exemplares, as do pulmão, incrivelmente hábeis em realizar as trocas gasosas; as células do seu cérebro despertam e aqueles neurônios todos que nunca foram usados acordam e, curiosos, observam o cenário e dizem: ‘’Deixe-me ver o que está acontecendo. ’’ De repente, todo o seu corpo funciona bem. O que, então, acontece com a ‘’pessoa’’? Ela funciona bem, também. É a famosa visita da saúde, a melhora antes da morte, a bela força da última chama da vela. E essa ‘’pessoa’’ tem a chance de mostrar ao mundo o motivo que a trouxe até aqui: amor. Terminando a dissolução do fogo, o encontro verdadeiro com sua essência, a ’’pessoa’’ descobrirá o sagrado que mora no mais profundo espaço dentro dela. Nesse espaço mais profundo e sagrado está o sopro vital. O sopro vital corresponde ao elemento ar, que nos foi emprestado por Deus (ou pelo Universo) para que realizássemos nossa missão na Terra. E, assim que essa missão estiver concluída, deveremos devolvê-lo a quem nos emprestou.

 Começa então a dissolução do ar. Essa é a fase da agonia, processo que a maioria das pessoas vai chamar de ‘’morrer. ’’ Porque a percepção real da morte iminente acontece somente na dissolução do ar. Até lá, o corpo está doente;

Na dissolução da água existe a tristeza, que pode ou não ser atenuada pelo antidepressivo, mas acontece. Então passamos pela fase de melhora, um tempo no qual a experiência de estar vivo parece plena. E entramos na fase de agonia: teremos que devolver o sopro vital. E ele sairá pelo mesmo caminho por onde entrou. Virá a fase da agonia respiratória, em que a pessoa respira mal, rápido ou devagar, depois faz uma pausa, seguida de uma respiração profunda. A ‘’pessoa’’ que morre está nua, liberta de todas as vestes físicas, emocionais, sociais, familiares e espirituais. E, por estar nua, consegue nos ver da mesma forma. Estar ao lado de alguém que está morrendo é desnudar-se também. Quanto tempo esse período vai durar? Ninguém sabe ainda. Esse ‘’não saber’’ do tempo nos traz a possibilidade de vivenciar o momento presente. Ele nos traz a oportunidade de experimentar a plenitude. Quando dizemos que nos sentimos plenos é porque estamos com o pensamento, o sentimento, a atitude e o corpo, todos juntos, no mesmo lugar, ao mesmo tempo. Estar ao lado de ‘’alguém’’ que se aproxima da morte pode ser um momento de plenitude na nossa vida, algo que ocorre rápida e fugazmente. A morte, do outro ou nossa, será uma rara ou até única experiência de estarmos verdadeiramente presentes na nossa vida.”

A autora Ana Claudia Quintana Arantes é uma das maiores referências sobre cuidados paliativos no Brasil. Ela afirma que não deveríamos nos assustar com a morte em si, mas com a possibilidade de chegarmos ao fim da vida sem aproveitá-la, sem usarmos nosso tempo da maneira que gostaríamos. Em  vez de medo e angústia, devemos aceitar nossa essência para que o fim seja apenas o término natural de uma caminhada.

O livro “A morte é um dia que vale a pena viver” foi lançado pela Editora Sextante.

MERGULHO PROFUNDO NO PERSONAGEM

Durante participação no programa “Encontro”, da Globo, Claudia Ohana contou detalhes do processo que viveu para dar vida a Dora. Sobre o processo da doença, ela mergulhou tão fundo na personagem que chegou a sentir fraqueza ao interpretar uma mulher vivendo os momentos finais do processo do câncer. “Foi vindo aos poucos, ela foi adoecendo e, aos pouquinhos, eu fui ficando com falta de ar. Tudo que estava escrito no texto, eu ia seguindo. E eu me lembro que, já no final, eu entrava na gravação, no estúdio, e já ficava com um sono. Eu já ia entrando, abaixava toda a minha energia para viver aquilo“, revelou.

Sorridente, a atriz confessou ainda que é “hipocondríaca e meio paranoica”, detalhe que fez com que sua família ficasse preocupada com todo o processo de gravação. “Eu falava: ‘tudo bem, não tem problema ficar assim’. Porque ela tinha falta de ar, pouca energia. Depois que eu saía da gravação, eu falava ‘Claudia, volta, que você tem a vida ainda’“, concluiu.

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Idealizadora do site OFuxico, em 2000 segue como CEO e Diretora de Conteúdo do site. Formada em jornalismo pela Faculdade Casper Líbero, desde os anos 1980 trabalha na área do jornalismo de entretenimento. Apaixonada por novelas, séries, reality, cinema e estilo de vida dos famosos.