Quem é Cartola, sambista homenageado pelo Google?
Por Flavia Cirino - 11/10/23 às 07:45
Cartola, sambista, compositor, poeta e cantor, um dos fundadores da tradicional escola de samba Estação Primeira de Mangueira, é o homenageado pelo Doodle nesta quarta-feira, 11 de outubro.
Se vivo estivesse, o artista completaria 115 anos. Nascido em 1908, no Rio de Janeiro, Angenor de Oliveira foi um dos maiores nomes da música nacional. Primogênito dos oito filhos do casal Sebastião Joaquim de Oliveira e Aída Gomes de Oliveira, passou seus primeiros anos de criança no bairro Catete, na Zona Sul carioca, e logo se mudou para a Mangueira.
Em 1925, ao lado de seu amigo Carlos Cachaça, ele criou o Bloco dos Arengueiros, que se expandiu e três anos mais tarde, em 28 de abril de 1928, se transformou na Mangueira.
Foi Cartola quem escolheu o nome e as cores da escola de samba – verde e rosa – inspirado no colorido de seu time de futebol, o Fluminense.
Cartola cresceu interessado em música, graças ao pai, que tocava cavaquinho e violão, instrumentos que ele logo aprendeu a dedilhar. Ele começou a trabalhar na juventude, como pintor e pedreiro, para ajudar no sustento da família.
Para evitar que o cimento entrasse no cabelo, durante o trabalho, ele usava um chapéu-coco. Assim ganhou o apelido de Cartola.
Vida boêmia e amor ao samba
Apaixonado por samba e Carnaval, aos 17 anos, já compunha e cantava em bares locais, muitas vezes com Carlos Cachaça, amigo e colaborador musical de longa data que conheceu no Morro da Mangueira. Nessa época, sua mãe morreu quando e as constantes brigas com o pai devido à sua vida boêmia o levaram a sair de casa.
Ele vive uma vida de malandragem, bebendo, freqüentando prostíbulos e dormindo em trens, até ser “salvo” por uma vizinha mais velha, Deolinda, que se apaixonou e levou Cartola para morar com ela. A casa era freqüentada por malandros e sambistas como Noel Rosa.
Alguns outros músicos juntaram-se à ele e Carlos Cachaça em 1928 e fundaram uma das primeiras escolas de samba do Rio, a Estação Primeira de Mangueira, onde Cartola era o diretor de harmonia.
Grandes intérpretes cantavam seus sambas e ganhou popularidade em 1932 com o hit “Divina Dama”. Sua linguagem poética e a emoção do samba ficaram evidentes no programa de rádio “A Voz do Morro”, destacando músicas como “Não Quero Mais”, “Sim”, e “O Sol Nascerá”.
Ascenção e queda
A consagração chegou em 1940, quando foi convidado pelo compositor Heitor Villa-Lobos para uma gravação de ritmos folclóricos brasileiros encomendada pelo maestro americano Leopold Stokowski, realizada em um navio ancorado no porto do Rio.
No mesmo ano ele estreou o programa “A Voz do Morro”, na rádio Cruzeiro do Sul. Na mesma década, começaram os problemas. Uma nova diretoria da Mangueira começou a boicotá-lo, e ele acabou deixando o morro. Cartola contraiu meningite e a mulher, Deolinda, morreu devido a um ataque cardíaco.
Ele trabalhou como vigia e lavador de carros, e se entregou à bebida, com diversos problemas de saúde. Por conta da falta de cuidado, Cartola perdeu muito peso e contraiu uma afecção no nariz conhecida como rinofima. Ele passou por uma cirurgia, mas, por descuido do próprio sambista, adquiriu uma mancha negra na região, sinal que se tornaria sua marca característica.
Seu sofrimento apenas teve fim quando ele foi encontrado por Eusébia Silva do Nascimento, popularmente conhecida como dona Zica, que o levou de volta ao Morro da Mangueira. Com ela, Cartola viveu até sua morte.
Dona Zica, o grande amor
Euzébia Silva do Nascimento, a Dona Zica, já tinha mais de 40 anos de idade quando se casou com Cartola, em 1954. Eles eram vizinhos no Morro da Mangueira, onde moravam, se conheciam desde jovens mas nunca haviam namorado porque ela já estava comprometida e na época a mulher era mal vista se o seu noivado fosse desfeito.
Zica casou-se aos 19 anos com seu primeiro marido, teve cinco filhos biológicos e adotou um sexto. Ficou viúva após 20 anos de casada. Cartola também se casou, porém não teve filhos, porque era estéril.
Após ficar viúvo, viveu mais de 10 anos longe da Mangueira. Um dia, voltou e reencontrou sua antiga amiga, Zica, e começou a se interessar mais por ela, e passou a namorá-la. Casaram-se e viveram juntos 26 anos, até a morte dele, em 1980.
Cartola foi redescoberto artisticamente pelo jornalista Sérgio Porto, lavando carros no bairro de Ipanema, na Zona Sul do Rio de Janeiro, e voltou a se apresentar no rádio e em bares e restaurantes. Foi Zica quem que o encorajou a seguir novamente sua paixão e vocação pela música.
Na década de 60 abriu, com dona Zica, o famoso restaurante Zicartola, que virou ponto de encontro dos maiores sambistas e músicos ligados à bossa nova, como Nara Leão, Paulinho da Viola e Nelson Cavaquinho. Apear de não durar muito tempo, o espaço entrou para a história da boemia carioca.
Cartola só lançou seu próprio LP em 1974, que fez grande sucesso, rendendo prêmios e elogios da crítica. Logo depois vieram mais três LPs, com destaque para “As Rosas Não Falam”, escolhida como trilha sonora da novela.
O sambista fez seu primeiro show individual aos 70 anos e se apresentaria e comporia pelo resto da vida. Seu legado continua vivo enquanto os músicos atuais tocam e gravam suas obras hoje.
Com Cartola morreu
A saúde do artista estava aos poucos se deteriorando por conta de um câncer na tireoide. E mesmo mantendo-se firme diante dos tratamentos para impedir o progresso da doença, Cartola faleceu no dia 30 de novembro de 1980, aos 72 anos de idade.
Até hoje, diversas homenagens são feitas à ele através de discos, biografias ou covers de suas letras, mantendo a imagem e espírito mais vivos do que nunca!
É jornalista formada pela Universidade Gama Filho e pós-graduada em Jornalismo Cultural e Assessoria de Imprensa pela Estácio de Sá. Ela é nosso braço firme no Rio de Janeiro e integra a equipe de OFuxico desde 2003. @flaviacirino