Veja detalhes das denúncias das vítimas do influencer religioso preso por abuso sexual
Por Flavia Cirino - 10/10/23 às 15:15
A polícia de São Paulo prendeu o influencer evangélico Victor de Paula Gonçalves, de 27 anos, sob suspeita de estuprar três jovens. Fundador do Galpão, grupo religioso voltado para jovens de Alphaville, área nobre de Barueri, em São Paulo, Victor Bonato, como é conhecido, afirmava participar de um movimento que era o “elo entre a pessoa que está perdida e a igreja”.
No último mês de setembro, as vítimas foram à Delegacia da Mulher de Barueri para denunciá-lo. Duas estudantes de medicina, de 19 e 20 anos, e uma empresária, de 24 anos, afirmam que o influenciador usou a “influência religiosa” para manipulá-las e obrigá-las a ter relações sexuais com ele.
O inquérito que baseia a prisão temporária do influenciador levou em consideração ainda a possibilidade de o coach fugir, já que havia dito que “se isolaria num retiro espiritual” ao saber das queixas e chegou a desativar alguns perfis na internet.
A advogada de Victor, Samara Batista Santos, afirmou por meio de nota que “é importante ressaltar que meu cliente nega veementemente as alegações contra ele, embora ainda não tenha sido realizado o interrogatório, em sede policial, com a sua versão”, diz o documento.
Detalhes dos depoimentos
O processo contra Victor Bonato corre sob sigilo na 2ª Vara Criminal de Barueri e autorizou sua prisão. Em sua decisão, o juiz Fabio Calheiros do Nascimento ressalta o fato de as três terem características físicas semelhantes. Além disso, os detalhes dos relatos sensíveis dados por elas são muito parecidos e, se comprovados, indicam um padrão praticado pelo religioso.
Vítima 1
A estudante de 19 anos, primeira a relatar o que teria vivido com Victor Bonato, contou à polícia que o influenciador passava a impressão de ser um homem religioso e bem-intencionado. Contudo, a relação começou a mudar a partir do último mês de junho.
Eles assistiam a um filme e Victor passou a mão pelo corpo dela. Em um intervalo de cinco dias, ela sofreu violência física, sexual e psicológica.
Depois desse primeiro incidente, Victor a procurou e, por mensagens, dizia estar interessado nela, insistindo para marcar um encontro. A jovem, por ainda “acreditar que ele era um homem correto”, combinou de encontrá-lo em sua casa, onde aconteceu o primeiro momento de violência.
Relatos do depoimento, obtidos pelo jornal O Globo, detalham que eles se beijaram, deitados num colchão, e Víctor colocou a mão dela à força em seu pênis. Ela ordenou que ele parasse e continuaram os beijos, Victor teria insistido para que eles transassem e a jovem disse que “não faria nada com ele”. Ele, então, a imobilizou, segurando seus punhos e jogou o corpo por cima dela, impedindo que ela se movimentasse.
No terceiro episódio, no dia 8 de junho, acompanhada de uma amiga – que também denuncia abusos do influenciador no inquérito –, ela mais uma vez foi à casa de Victor ver um filme. Ele, novamente, teria começado a passar a mão pelo seu corpo e a denunciante, então, resolveu ir para casa, irritada com a situação. O influenciador mandou uma série de mensagens pedindo para encontrar com ela e que acabou indo até a sua casa e eles tiveram uma relação sexual inicialmente consensual, mas que se “tornou um verdadeiro pesadelo”.
Durante o ato, Victor teria começado a agredi-la com força, dando tapas em seu rosto e dizendo que estava fazendo aquilo “por você não ter me dado daquela vez”, referindo-se aos episódios em que ela se negou a transar com ele.
Por fim, no dia 9 de junho ela voltou a se encontrar com o influenciador. A suposta vítima disse que ficou muito assustada com tudo o que aconteceu, mas que ainda continuava conversando com o influencer. Eles teriam dormido juntos e, no dia seguinte, ele teria dito: “vou te dar duas opções, ou eu vou te levar para almoçar e você vai me deixar puto, ou eu vou tirar toda a sua roupa”, em tom de ameaça. Com medo, ela disse ter se sentido forçada a tirar a roupa para ele mais uma vez.
Vítima 2
O segundo relato é de uma estudante de 20 anos. Ela contou aos policiais que, no dia 27 de julho, foi até a casa de Victor e o influencer teria começado a passar mão pelo seu corpo. Irritada, ela foi embora.
Dois dias depois, voltou à casa dele, consensualmente, e trocou beijos. O religioso pegou a mão dela e colocou à força em seu pênis. A jovem tirava e ele colocava de novo, mesmo enquanto ela pedia para que ele parasse. Victor teria insistido para que ela fizesse sexo oral nele, até que ela foi embora.
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A estudante contou que Victor passou a enviar mensagens de cunho sexual. No último dia 20 de agosto, ela aceitou um convite para ir à casa dele. Durante um beijo, ele teria abaixado as calças e insistido, mais uma vez, para que ela fizesse sexo oral nele. Apesar de a moça dizer que não queria Bonato colocou o corpo por cima dela, que estava deitada no sofá, imobilizando-a, e colocou o pênis à força em seu rosto.
A violência só terminou quando ela tocou no pênis dele no sentido de afastá-lo e ele acabou ejaculando. Ela foi embora e ele nunca mais voltou a tocar no assunto.
Vítima 3
Uma empresária de 24 anos foi a terceira denunciante e disse na delegacia que Victor, na casa dele, também passou a mão pelo seu corpo sem que ela permitisse e acrescentou que ele utilizava de vários argumentos e da sua influência como um líder religioso para tentar fazer com que ela tivesse relações sexuais com ele, até que acabou consentindo.
No último dia 22 de julho a vítima ia embora de um restaurante com Victor e uma amiga – também denunciante no processo –, e os três foram para a casa dela. Chegando lá, ele esperou o momento em que os dois ficaram a sós e tirou a própria roupa para esperá-la e surpreende-la. O influenciador insistiu para que eles transassem e a segurou pela cabeça, forçando que ela fizesse sexo oral nele sem o seu consentimento.
Ela pediu para que Victor parasse, sem sucesso. Depois, tiveram relações sexuais consensuais até o momento em que Victor a segurou com força pelas mãos e a teria esganado.
Conversando com outras amigas que frequentavam o Galpão, a vítima percebeu que Vítor já havia realizado comportamentos parecidos com outras meninas, o que as motivou a registrar a ocorrência na Delegacia da Mulher.
Vitor dá indícios de que poderia fugir
Ao tomar ciência sobre as denúncias, Victor usou as redes sociais para dizer que “sumiria um tempo para mergulhar num retiro espiritual”. A possibilidade de o suspeito fugir também embasou o pedido de prisão temporária, que foi acatado pela Justiça.
O Ministério Público de São Paulo também se manifestou favorável à prisão de Victor, pontuando que “revela o infrator incontrolável inaptidão para o convívio social e, em liberdade, certamente voltará a delinqüir, com sério prejuízo à tranqüilidade e à ordem pública, uma vez que é tido como um líder religioso, sendo cercado por inúmeros adolescentes e jovens, gozando de grande influencia entre eles”.
A promotoria acrescentou ainda que, “há a informação da existência de outras vítimas, ainda não identificadas, que podem ser coagidas a não denunciarem os abusos, diante do poder que o averiguado teria sobre os frequentadores da instituição religiosa”, e que ele “poderia estar planejando se evadir, sobre o pretexto de realizar um retiro espiritual, já tendo desativado os perfis nas redes sociais”.
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Em trecho da decisão que autorizou a prisão temporária, o juiz também cita, concordando com o inquérito policial, a necessidade de manter Victor preso para evitar que ele prejudique as investigações que ainda estão em curso.
“No mesmo relatório foram transcritos algumas mensagens de áudio atribuídas ao suspeito e enviadas às vítimas. Nessas mensagens de áudio ele não faz referência expressa à sua posição na organização religiosa, mas explicitamente exige de modo insistente e agressivo obter imagens do corpo das vítimas, usando as expressões “para de gracinha”, “estou mandando” e “está maluca que você vai me desobedecer”. Tais conteúdos atribuídos ao suspeito corroboram o relato das vítimas e tornam factível a alegação de que ele pode ter inclusive usado de força física para a prática de atos sexuais contra a vontade delas”, destaca.
“De outro lado, a autoridade policial demonstrou a necessidade da prisão temporária para a investigação. Tratando-se de pessoa que exerce algum influência no âmbito de um grupo religioso, contexto no qual os supostos crimes teriam sido praticados, é de se acreditar que sua liberdade possa acarretar risco para o livre desenrolar das investigações, especialmente a identificação de eventuais outras vítimas e testemunhas”, acrescenta, e conclui: “como os indícios apontam para a prática de crime de estupro, considerado hediondo, nos termos do artigo 1o, II, da Lei 8.072/90, é possível a duração da cautelar por 30 dias”.
Religioso confessa e pede desculpas
Antes de ser preso, Bonato postou um vídeo no qual diz ter “cometido pecados” e caído em “imoralidade e iniquidade”. “Fui contrário a tudo que eu prego e desagradei o coração de Deus. Falhei com Deus, com minha família e em todos que confiam em mim”, afirma na gravação que ainda diz estar envergonhado e arrependido pelo que fez.
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“Eu magoei pessoas, feri pessoas e trouxe vergonha para um ministério lindo que é o Galpão. Estou vindo publicamente me confessar porque decidi deixar isso pra trás e eu quero construir certo, na luz, a partir de agora. Vim confessar pra que fique claro que errei e falhei, não o Galpão”.
Em seguida, sem dar detalhes, refere-se “às meninas”: “Quero pedir perdão às meninas com quem eu falhei, que eu defraudei e magoei, com quem eu não tive atitude de homem”.
É jornalista formada pela Universidade Gama Filho e pós-graduada em Jornalismo Cultural e Assessoria de Imprensa pela Estácio de Sá. Ela é nosso braço firme no Rio de Janeiro e integra a equipe de OFuxico desde 2003. @flaviacirino